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Em velhos e novos bares de Manaus, Leandro Abess continua vendendo CDs

Se há alguém que conheça todos os bares do Centro de Manaus. Isso mesmo, todos. É Leandro Abess de Oliveira. Há 45 anos, diariamente, ele percorre as ruas do Centro, hoje vendendo CDs, mas inicialmente vendendo LPs (vinis).

Leandro começou a trabalhar, aos 19 anos, como vendedor nas lojas S. Monteiro. Um dia decidiu que não queria ter patrão nem maiores compromissos com regras e horários. Era o ano de 1976.

“Resolvi vender LPs no mercadão (Adolpho Lisboa) e logo passei para as embarcações, atracadas ali perto. Vi que o negócio era bom. Vendia muitos discos. Comprava em duas lojas, Discolândia e Vitória Régia, que ficavam próximas ao Canto do Quintela (cruzamento das avenidas Joaquim Nabuco com Sete de Setembro). Levava os discos dentro de duas caixas de papelão, da RCA Victor, uma em cada braço”, lembrou.

Até que Leandro observou que os bares estavam repletos de clientes em potencial, amantes dos mais variados estilos musicais, sambas, boleros e choros. E passou a frequentá-los.

Leandro morava, e mora, na Cachoeirinha, de onde parte praticamente todos os dias, de domingo a domingo, rumo ao Centro, faça chuva ou faça Sol. Mesmo durante a pandemia, quando todos os bares fecharam, ele saía, na direção da Manaus Moderna, e conseguia vender alguns CDs. Nessas mais de quatro décadas de caminhadas, o andarilho conheceu bares, que já existiam, outros que abriram e tantos que fecharam as portas, principalmente porque o proprietário morria e seus descendentes não continuavam com o negócio.

Sucumbiram ao tempo

Entre os bares que Leandro viu sucumbir ao tempo, ele recordou do Natália, que ficava próximo ao Colégio Militar e o Salão Grajaú, onde atualmente existem vários salões de cabeleireiros. Na mesma rua ficava o Central, pouco antes do Caldeira. O Caldeira é um dos mais tradicionais de Manaus e recebeu este nome após a explosão, em 1970, da caldeira da Santa Casa de Misericórdia. Antes, desde 1963, se chamava N. Sra. dos Milagres e já era reduto de políticos, empresários, funcionários públicos, poetas, músicos, escritores e trabalhadores do Centro.

“O Balalaika, na Epaminondas com a Leonardo Malcher, em frente ao edifício Mônaco, ficava num casarão estilo antigo, que foi derrubado e construíram no local aquela caixa onde hoje funciona a drogaria Balalaika”, disse.

Outros bares que Leandro lamenta terem fechado são o Cipriano, na Ferreira Pena com Airão que, após as mortes dos dois irmãos proprietários, agora só funciona na hora do almoço sob a direção do filho de um deles. O Alex Bar, na Saldanha Marinho com Getúlio Vargas que, devido não conseguir abrir durante a pandemia, foi fechado de vez pelos filhos do proprietário, que já morrera há alguns anos. No espaço, agora, funciona uma drogaria. A Chopperia São Marcos, na Quintino Bocaiúva com Floriano Peixoto, cujo filho do proprietário resolveu alugar o prédio, que virou o depósito de uma loja de produtos chineses. A Chopperia Lobo’s, na Dr. Machado. E o Galo Carijó, na Miranda Leão com Pedro Botelho, famoso pelos peixes fritos que servia. O filho do proprietário ainda continuou com o bar/restaurante por algum tempo, após a morte do pai, mas acabou por fechá-lo.

“Depois que os pais morrem, dificilmente os filhos têm o mesmo pique”, acrescentou.

Vinil está voltando

Alguns poucos bares, no entanto, os filhos continuaram com o legado dos pais: Armando, no Largo de São Sebastião; Carvalho, na Cachoeirinha; Calçada Alta, na Costa Azevedo, e Jangadeiro, na Marquês de Santa Cruz. Estes quatro estabelecimentos mais o Snoopy Bar, na Japurá; e a Peixaria Metal, na Lima Bacury com Rua Isabel são frequentados diariamente por Leandro, pois já possui clientes cativos.

O vendedor de discos é uma daquelas figuras que ficará marcada na história de Manaus. Leandro não usa relógio e nunca teve celular. Por volta das 8h ele sai de casa e só volta quando se aproximam às 22h. Todos os dias. E não anda de ônibus. As dezenas de amigos que fez nos bares o chamam de ‘Interbairros’. Aos 70 anos, ele não sabe o que é adoecer.

Além do Centro ele tinha a Praça do Caranguejo, no Eldorado, na rota, mas como o movimento ficou fraco por lá, não vai mais para aquela direção, porém, o Educandos, permanece. O Bar da Carmosa, o mais tradicional da Cidade Alta, e o Pelegrino, próximo ao Amarelinho, recebem sua visita nos finais de semana.

Quando Leandro começou a vender LPs, em 1976, as vendas eram ótimas. Vendia de 20 a 30 unidades por dia. No início da década de 1990 estes deram lugar aos CDs, que agora também estão sumindo.

“Apesar de as vendas terem diminuído, ainda vendo bem. Uns 30 por dia. E o vinil está voltando. Já tenho clientes solicitando LPs. A maioria dos meus clientes têm mais de 50 anos, mas têm jovens, que pedem discos de rock”, informou.

E assim o vendedor de discos segue a sua sina de levar a música onde o povo está e, às vezes, ele até canta um trecho, quando o cliente a desconhece. Aparelhos de som também não tem em casa. O aparelho é ele.

“Enquanto puder andar e carregar a bolsa com os discos, continuo com o meu trabalho”, avisou.

Foto/Destaque: Divulgação

Evaldo Ferreira

é repórter do Jornal do Commercio
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