O presidente Jair Bolsonaro e o ministro da Economia, Paulo Guedes, anunciaram publicamente, nesta semana, que o salário mínimo de 2020 será corrigido de R$ 1.039 para R$ 1.045, por meio de medida provisória a ser editada nos próximos dias. Economistas ouvidos pelo Jornal do Commercio apontam que, embora gere preocupações em torno das contas públicas, e faça diferença para quem ganha tão pouco, o novo valor dificilmente fará diferença para o crescimento do país.
O valor teve de ser revisto porque a inflação, vitaminada pelo aumento da carne e do dólar, superou as previsões do Planalto. No final de 2019, o governo editou uma MP com reajuste de 4,1%, elevando o mínimo de R$ 998 para R$ 1.039, conforme estimativas do mercado financeiro para o INPC. O indicador é usado no reajuste do mínimo, por força de lei, embora a inflação oficial seja medida pelo IPCA – que fechou 2019 em 4,31%. Ocorre que o INPC fechou o ano com alta de 4,48%.
O novo aumento deve gerar impacto de R$ 2,3 bilhões nas contas públicas, conforme o Ministério da Economia. A expectativa é que o gasto extra seja compensado por ganho de R$ 8 bilhões na arrecadação. “Nós já temos, mas prefiro não falar da natureza do ganho, que vai ser anunciado possivelmente em mais uma semana. Não é aumento de imposto, não é nada disso. São fontes que estamos procurando”, declarou Paulo Guedes.
O governo estima que, para cada aumento de R$ 1 no salário mínimo, as despesas elevam-se em R$ 355,5 milhões, principalmente por causa do pagamento de benefícios da Previdência Social, do abono salarial e do seguro-desemprego, todos atrelados ao mínimo. De acordo com o ministro, caso não seja possível cobrir o aumento de gasto no orçamento para custear o valor do mínimo, o governo não descarta algum contingenciamento.
Política sem ganho
O economista e ex-supervisor técnico do Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos) e coordenador regional da ABED (Associação Brasileira dos Economistas pela Democracia), Inaldo Seixas, destaca que a correção do mínimo é feita pelo INPC porque o indicador é calculado também em cima dos vencimentos das famílias de baixa renda.
Para ele, o governo está apenas cumprindo a lei, quando deveria focar em ganhos reais para o trabalhador. Especialmente quando se leva em conta o atual panorama de inflação em baixa – a despeito do recente repique de dezembro – e da lenta retomada da economia brasileira e seus elevados índices de desemprego.
“O governo vem flexibilizando o trabalho e reduzindo a renda, argumentando que isso gera confiança e atrai investimento. Mas, o que gera crescimento é a demanda e a capacidade agregada por uma política que gere ganhos salariais reais. Cada R$ 1 a mais para famílias que ganham de um a três salários mínimos gera consumo de 80% em relação a sua renda extra. Isso fortalece a demanda interna, que é importante para a economia de um país que exporta praticamente apenas produtos primários”, justificou.
Inflação regional
Na mesma linha, embora pondere que correções maiores geram dispêndios previdenciários mais pesados para os cofres públicos, o presidente do Corecon-AM (Conselho Regional de Economia do Estado do Amazonas), Francisco Mourão Junior, lamenta que o Ministério da Economia tenha excluído de seus cálculos os efeitos positivos na demanda agregada gerados por uma política eventualmente menos hostil ao salário mínimo.
Em conversa anterior com o Jornal do Commercio, o economista já havia antecipado que os índices de inflação viriam reforçados em dezembro, em virtude da alta do dólar e da escalada do preço da carne. Chamou a atenção também para o fato de que a flutuação dos preços não ocorre no mesmo ritmo em todo o país e que regiões como o Amazonas sofrem acréscimos pelo custo dos combustíveis e do frete.
“O INPC não reflete a realidade de nosso Estado, bem como o da maior parte da região Norte, pois é medido até Belém [PA]. O país precisa de outra política para o salário mínimo, mas dificilmente o ministro Paulo Guedes vai se incomodar com isso”, encerrou.