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É ridículo o CBA não estar operando

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Márcio Holland, professor doutor e pesquisador, coordenou uma equipe multidisciplinar da Fundação Getúlio Vargas (FGV), participantes do Estudo “Zona Franca de Manaus Impactos, Efetividade e Oportunidades”, em 2019. O estudo levantou e analisou indicadores que provaram a efetividade do Programa ZFM a partir de ferramentas econométricas. Holland esteve em Manaus neste mês para um ciclo de palestras e reuniões com lideranças empresariais para alinhar estratégias para a segunda parte do Estudo. Na oportunidade, pontuou em entrevista os principais desafios deste modelo que em 2020 completa 53 anos de sua implementação.

Professor na Escola de Economia da FGV, foi diretor de Pós-Graduação da FGV-EESP, de 2006 a 2010, secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, de 2011 a 2014 e pesquisador nível 1 do CNPq. É autor de livros como "A Economia do Ajuste Fiscal: Por que o Brasil quebrou?, entre outros títulos, além de assinar diversos artigos acadêmicos sobre temas de macroeconomia.

Jornal do Commercio – Qual foi a principal mudança de percepção dos pesquisadores depois da realização do Estudo?

Márcio Holland – O nosso estudo como foi baseado em dados econômicos, sociais e financeiros da região. Conseguiu mostrar alguns pontos muito interessantes que nos surpreenderam, que mostra êxitos como a consolidação de um parque industrial bem diversificado, bem sólido e moderno. O grau de escolaridade dos trabalhadores na indústria de transformação aqui é muito alto, inclusive, em proporção no total de trabalhadores é o maior do Brasil, mais de 70% dos trabalhadores da indústria de transformação tem ensino médio completo e mais de 12% tem ensino superior completo. De alguma forma, o Programa Zona Franca de Manaus impactou a região no sentido da renda per capta, os estudos mostram que essa renda na região seria praticamente a metade do que é hoje se não fosse o programa. Então, a Zona Franca de Manaus têm alguns elementos inovadores que nos surpreendeu inclusive no nosso Estudo, pois sabíamos muito pouco.

JC – O que o Amazonas perde deixando de investir no Centro de Biotecnologia da Amazônia (CBA) como um polo de bioeconomia, ideia inicial de quando ele foi lançado há quase vinte anos?

Márcio – Fiz uma visita ao CBA e me surpreendeu o potencial que o Centro tem. De um lado, é um centro de biodiversidade do Amazonas instituído há quase 20 anos  – sem quase nenhuma realização – o que a gente pode considerar mais um absurdo, algo ridículo, como é que pode um Centro de biodiversidade do Amazonas não estar operando? De outro lado tem muita promessa, muita vontade e determinação e eu acredito muito na liderança do Coronel Menezes frente à Suframa para rever essa história. Eu imagino que a Suframa esteja trabalhando nesta direção pelo o que eu vi.

Na discussão sobre desenvolvimento regional no Brasil a ZFM ficou ao largo por muitos anos e com a reforma tributária ela voltou a ser discutida – e que agora nós temos que falar sobre isso, e a Zona Franca aparece no bojo dessa discussão do desenvolvimento regional e de políticas públicas em desenvolvimento regional. Dentro do modelo Zona Franca algo que pode ser feito para aperfeiçoar o modelo tem muito a ver com a governança do modelo. O Polo Industrial de Manaus gera muitos recursos financeiros, muitos deles tem a ver com a condicionalidade de recursos em P&D, associada ao processo produtivo básico (PPB). A localização, insumos, em geral. Entretanto, não há uma governança muito clara sobre esses recursos financeiros para gerar realmente spin overs ou externalidades positivas para a região. Eu acho que dá pra aperfeiçoar o modelo melhorando a governança desses recursos de forma que permita que se tenha programas de educação de qualidade básica; e em diversos outros municípios do Estado que não seja só Manaus, melhoria da qualidade de vida da população em termos de acesso à água potável, saneamento básico, etc.

JC – O 1º ciclo do Estudo da FGV sobre a efetividade da ZFM conclui pontos positivos como a escolaridade dos trabalhadores, 50% tem o ensino médio completo, um índice maior até que o de São Paulo, de 30%. Quais argumentos serão necessários para rebater tantos críticos ao modelo de desenvolvimento e as propostas de substituição?

Márcio – É importante entender porque que temos essas críticas, uma tem a ver com o custo alto do programa e tem que entender isso, qual é o efetivo do programa? Outra grande crítica é que o modelo provoca muita ineficiência econômica no país, com “passeio” de insumos e componentes por todo o Brasil, uma região remota, distante do mercado consumidor. Todas essas críticas deveriam ser absorvidas, no sentido de preparar alterações no modelo que permita que tenha um modelo autossustentável. O modelo tem que tirar proveito da situação do debate atual em torno da reforma tributária, da abertura econômica para em vez de criticar, aceitar a agenda de reformas, e propor soluções. Este é o grande desafio. Da mesma forma não faz o menor sentido você imaginar um modelo completamente diferente do que está aqui da “noite para o dia”. Hoje a ZFM emprega em torno de 90 mil trabalhadores diretamente no Polo Industrial de Manaus, tem aí provavelmente quase 500 mil empregos induzidos sendo gerados para uma população de Manaus de 2.1 milhões de habitantes, tem impacto muito relevante para a região metropolitana de Manaus, há muito debate sobre isso, e as alternativas apresentadas até agora não são boas, seja alternativas na forma de Fundo de Desenvolvimento Regional, Constitucional, que parece ter lados positivos, mas têm limitações, seja na forma de um novo modelo de desenvolvimento econômico baseado em bioeconomia que tem vantagens. A região deveria já estar adotando isso, mas não me parece ser um substituto perfeito para o modelo atual. Eu acho que temos que tirar proveito deste momento para fazer reflexões sobre o modelo, a economia do Estado do Amazonas, a floresta amazônica e o que fazer com a região norte do Brasil para termos prosperidade em todo o País. 

Redação

Jornal mais tradicional do Estado do Amazonas, em atividade desde 1904 de forma contínua.
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