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Dos guardanapos às telas impressionistas

Evaldo Ferreira: @evaldo.am

Ninguém se faz sozinho e os pais são muito importantes nesse processo quando se preocupam com o futuro dos filhos.

Nelson Freire nasceu em Itacoatiara, há 52 anos, menino pobre. Com dificuldade a mãe Raimunda Freire Lima o criou e aos irmãos.

“Ela nunca foi artista plástica, mas tinha a sensibilidade de um. Fazia desenhos em panos para guardanapo e mandava eu pintar os desenhos. Eu tinha uns doze anos. Me ensinava como fazer para que a pintura ficasse mais bonita. Depois eu saía às ruas de Itacoatiara vendendo os guardanapos. Vendia todos e trazia o dinheiro para ela, que então comprava comida para nós. Assim conseguiu nos criar, eu e meus três irmãos”, lembrou Nelson.

Os anos passaram, Nelson se tornou adolescente sem deixar de pintar, mas foi evoluindo tanto nas técnicas quanto no material utilizado.

“Como a gente não tinha dinheiro para comprar uma tela, minha mãe pegava caixas de papelão, colava e fazia as telas. A moldura era de palitos de picolé e de fósforo colados nas bordas do papelão, então eu pintava os quadros e ia vender. E as pessoas compravam, para nos ajudar. Tinha um supermercado que pagava as telas com ranchos. O pessoal via que a gente se esforçava para sobreviver”, recordou.

“Entre os meus irmãos, eu era o único que tinha essa ‘queda’ para as artes, por isso a minha mãe investiu nisso, mas ela também mandava a gente estudar. Queria que tivéssemos um bom futuro”, completou.

E dona Raimunda, além de desenhar para o filho pintar e montar as telas em papelão, ainda fazia os pincéis e criava tintas.

Vendia nas ruas

“Tem um capim chamado barba de bode, que possui fibras muito finas, os quais ela transformava em pincéis e ainda graduava a quantidade das fibras começando com um pincel bem fino e ia engrossando em várias graduações. O verniz que eu usava para cobrir a pintura, tornando-a mais bonita, ela fazia com clara de ovo. A tinta era guache, a mais barata à venda”, contou.

Nelson também não se acanhava em pedir material de pintura para conhecidos com maior poder aquisitivo, e estes não se negavam a lhe dar.

Quando estava com 18 anos, o rapaz conseguiu seu primeiro emprego com carteira assinada. A partir daí, com dinheiro a mais no bolso, começou a comprar material profissional, telas, tintas e pincéis.

“Com 20 anos eu comecei a vir para Manaus trazendo minhas telas. Telas com paisagens vendiam bem. Vinha aos finais de semana. Ficava, geralmente, na esquina das ruas Barroso e Henrique Martins oferecendo meus quadros para todo mundo que passava. Às vezes não vendia bem, mas tinha dias que eu vendia tudo”, contou.

Nessa época o itacoatiarense começou a comprar e ler livros sobre artes e ficou conhecendo os grandes nomes das artes plásticas do Brasil e do mundo.

“Mas uma coisa que eu disse desde o começo: não queria copiar nenhum deles. Meu desejo era ter meu próprio estilo. Queria que as pessoas soubessem que um quadro era meu só em olhar para ele”, falou.

Pensando dessa forma, Nelson enveredou por vários estilos, abstrato, contemporâneo, realista, hiper realista.

“Eu faço qualquer traço, mas há dez anos desenvolvi meu próprio estilo dentro do impressionismo, com cores mais escuras, pintando motivos amazônicos, usando espátula e outras vezes as mãos”, informou.

Continua dando palpites

Nelson morou um ano, em Brasília, levado por um marchand, que acabou por lhe enganar ao ver que seus quadros vendiam muito. Na capital do país ele só pintava abstratos.

“Quando descobri que ele me pagava um preço por meus quadros e os vendia por bem mais do que o dobro, resolvi trabalhar por conta própria. Voltei para Manaus e atualmente minhas obras são vendidas na Etnia Amazônia e Ateliê de Arte & Galeria, na rua Tapajós, ao lado da igreja de São Sebastião, ou pelo meu Instagram @freireartes”, avisou.

Recentemente, a pedido da artista plástica Rosa dos Anjos e seu marido Marlon Prado, proprietários da Etnia Amazônia, Nelson pintou um quadro de Pereira, um dos maiores compositores e cantores da Amazônia. O artista recebeu o quadro como presente de seu aniversário. Enquanto Pereira se apresentava para os fãs, no domingo, 31, durante o evento ‘Pintura ao vivo no Largo’, Nelson pintava um quadro do Teatro Amazonas cercado pelas águas do Negro.

“Graças à dona Raimunda, que até hoje vive em Itacoatiara, me tornei um artista plástico conhecido, vivo da minha arte e sou respeitado pelos meus pares. Ela continua dando palpites nos meus quadros”, riu.

“Um dos ensinamentos de minha mãe foi pintar a leveza e a beleza da natureza e conhecer as várias tonalidades das cores como, por exemplo, de uma folha, desde quando está viva até totalmente seca. São muitas tonalidades diferentes nesse processo. Busco essa variedade em tudo na natureza. Essa é a sabedoria de dona Raimunda”, finalizou.

Informações: 9 9385-7875.         

Evaldo Ferreira

é repórter do Jornal do Commercio
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