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Desvendando o passado amazônico com ciência

Desvendando o passado amazônico com ciência

Desde segunda-feira, 8, estão abertas as inscrições para o curso livre on-line ‘Arqueologia Amazônica’, organizado pelo arqueólogo Bruno Pastre Máximo, do Laboratório de Arqueologia do Museu Amazônico. As inscrições encerram no dia 11, quinta-feira, e o curso durará de 15 de junho a 30 de julho. Qualquer pessoa pode participar, desde que goste e tenha interesse em estudar as culturas e o modo de vida dos povos do passado.

“A arqueologia hoje é fundamental para refletirmos sobre o papel da relação dos humanos, no caso os povos indígenas, com o meio ambiente. Nas pesquisas recentes podemos ver com segurança como a região amazônica era densamente povoada, com milhares de sítios arqueológicos espalhados nas calhas dos rios e mesmo em terra firme”, falou Bruno.

Estas populações conseguiram, de forma bastante única e singular, prosperar, se multiplicar e viver uma vida com qualidade sem destruir o meio ambiente ao redor. Praticando um manejo cuidadoso e de longa duração, foram sendo selecionadas na floresta espécies frutíferas e de interesse humano, que permitiram uma maior biodiversidade de animais.

“Assim, os povos indígenas nos deixaram um legado único: a preservação e o enriquecimento do meio ambiente. A arqueologia é fundamental para conhecermos este legado e propor esta reflexão sobre o nosso presente e futuro. Se por décadas, os povos indígenas e a sua cultural foram consideradas atrasadas ou primitivas, hoje devemos valorizá-la e incorporá-la em nossas identidades”, afirmou.

As famosas TPIs

No início do ano passado o arqueólogo Márcio Amaral, do Instituto Mamirauá, conseguiu mapear dez sítios arqueológicos na Estação Ecológica Jutaí-Solimões e na Reserva Extrativista Rio Jutaí. Sítios arqueológicos são determinados espaços onde, no passado e, em muitos casos até hoje, vivem populações. As pesquisas conseguem descobrir vestígios, de milhares de anos, das populações que ali viveram.

Neste caso, Márcio observou uma característica bem peculiar dos sítios. As famosas TPI (Terra Preta de Índio). As TPIs são manchas de solo escuro em meio ao solo típico amazônico, amarelado, ácido e com baixa fertilidade. As TPIs são ricas em nutrientes, encontradas em toda a bacia amazônica e que podem variar de áreas menores, de cerca de um hectare, até extensões com mais de cem hectares. Tem de 30 cm a um metro de profundidade e indicam que ali viveu uma população acumulando matéria orgânica por séculos.

Outra característica citada por Bruno, e comprovada por Márcio, foi a seleção das árvores frutíferas plantadas nas proximidades das TPIs, como palmeiras de açaí, pupunha, bacaba, ingá e vários outros frutos, até hoje apreciados pela gente amazônica.

Márcio concluiu que, onde tem TPI, existe um sítio arqueológico, por sua vez, cercado por árvores frutíferas.

Acredita-se que os mais antigos sítios arqueológicos da Amazônia tenham sido ocupados há três, quatro mil anos e é comum, nos interiores, as populações atuais viverem sobre estes sítios, exatamente se aproveitando da riqueza do solo para manter suas plantações.

Entre os cacos cerâmicos encontrados nos sítios na Estação Ecológica Jutaí-Solimões e na Reserva Extrativista Rio Jutaí, Márcio identificou duas tradições: a Polícroma da Amazônia e a Pocó. Os registros dos povos da tradição Pocó indicam que eles já viviam na Amazônia ao menos mil anos antes de Cristo. Tais registros foram verificados, inicialmente, em regiões dos rios Nhamundá e Trombetas, quase 1.500 km de distância, em linha reta, do atual lugar, o que comprova o quanto estes povos andavam de um lugar para o outro na imensa floresta.

Sem o Estado

“Acredito que, atualmente, a arqueologia amazônica é bem destacada mundialmente. As pesquisas dos últimos 20 anos mostram com clareza a magnitude da intervenção humana no manejo da floresta amazônica. Como um imenso jardim, durante milênios foi sendo construído para favorecer as populações humanas e enriquecer a biodiversidade”, lembrou Bruno.

Há alguns anos a Embrapa Amazônia Ocidental reuniu pesquisadores da Alemanha, Canadá, Estônia, Senegal, Japão, Indonésia, Suécia e Holanda interessados em conhecer mais sobre a fertilidade da TPI. 

“Toda essa rica herança deixada pelos povos que habitaram a Amazônia foi conquistada sem a presença do Estado, ou como projeto de exploração deliberada da força de trabalho humana. Ao realizarem tamanha obra sem ter um Estado centralizado, e ainda mais nos trópicos, isto não encaixa nas teorias arqueológicas convencionais, que associam trabalhos coletivos a centralização e presença de Estado. Assim, a arqueologia amazônica permite colocar questões para o mundo sobre organização social e política, trabalho e desenvolvimento desses povos”, disse Bruno.

Quando chegou o primeiro ser humano na Amazônia? O que significam as decorações cerâmicas? Como eram as cidades da Amazônia? Estas e muitas outras perguntas serão abordadas por especialistas em uma linguagem fácil e acessível para o grande público no curso ‘Arqueologia Amazônica’, que será gratuito.

“Queremos que os participantes reflitam sobre a importância da presença indígena para a preservação da floresta e da biodiversidade”, concluiu.

Link para inscrição: https://forms.gle/kr6ExXWTxMNSWSJA6

Evaldo Ferreira

é repórter do Jornal do Commercio
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