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Cortes de ICMS terão pouco efeito no bolso do consumidor

Marco Dassori

Twitter: @marco.dassori  fACE: @jcommercio

O governo estadual anunciou que vai atender a Lei Complementar 194/2022 e reduzir a alíquota de ICMS sobre os combustíveis, de 25% para 18%. Economistas ouvidos pela reportagem do Jornal do Commercio estimam que a medida deve dar alívio ao consumidor, mas destacam que o impacto será pequeno e momentâneo. Na análise dos especialistas, não será suficiente para impulsionar o PIB com os investimentos e contratações que o país precisa e pode trazer perdas de arrecadação para Estados e municípios. Há dúvidas também de qual será o tamanho do desconto repassado pelas distribuidoras e postos.    

A conselheira do Corecon-AM, ex-vice-presidente da entidade, e professora universitária, Michele Lins Aracaty e Silva, ressalta que vai demorar “um pouco” para as famílias sentirem esse alívio, diante da perda acumulada do poder de compra nos últimos meses. “Em relação ao preço praticado nos postos, os efeitos são menores, mas são consequência das férias escolares. Isso tem acontecido nos últimos anos, durante esse período”, comentou.

A economista calcula que a média de preços, que estava em R$ 7,29 antes do recesso letivo, pode ir a R$ 6,19, com a redução da alíquota. Mas, lembra que tudo vai depender do tamanho do repasses ao consumidor e que não há garantias de que ele seja integral. Por isso, recomenda que a população pesquise e procure o posto onde o valor está mais acessível, embora saliente que o Procon tem promovido ações de fiscalização nos postos de combustíveis da capital – antes mesmo da publicação do decreto.

“Acredito que o alívio não terá um impacto significativo sobre a inflação e PIB. Ademais, tem um prazo de vigência e já existe preocupação dos economistas, empresários e investidores com a situação pós-eleição. Outro ponto a ser destacado é o repasse aos municípios que será reduzido, e isso impactará no orçamento municipal. Também não podemos esquecer da inflação global, da pandemia que ainda não acabou, das baixas expectativas de crescimento mundial e que o conflito entre Rússia e Ucrânia não dá sinais de ser encerrado”, listou.

“Gota no oceano”

O também conselheiro do Corecon-AM, professor universitário e consultor empresarial, Leonardo Marcelo Braule Pinto, concorda que o repasse vai chegar de alguma forma, mas avalia que não será proporcional. “Combustível é um bem de demanda inelástica. Dificilmente o valor varia para baixo e, quando isso acontece, é pouquíssimo. Há uma redução de sete pontos percentuais na alíquota. Talvez a diferença que chegue ao consumidor seja de dois pontos percentuais. Parte desse benefício certamente vai ser embolsado”, frisou.

No entendimento do economista, o efeito da medida no bolso da população será “uma gota no oceano”, diante do avanço da inflação, dos juros e do endividamento das famílias. “Temos uma economia estagnada e dando passos de tartaruga, devido à política macroeconômica adotada pelo país. Uma iniciativa como essa vem para amenizar, embora não da forma como deveria. Vamos ter um leve impacto na inflação, mas nada significativo. Mas, em termos de impulsionar o PIB e ensejar contratações, pouco se espera. A não ser que seja acompanhado por outras medidas”, avaliou.

Questionado sobre quais medidas seriam essas, Leonardo Marcelo Braule Pinto sugeriu iniciativas que facilitem de fato a abertura de crédito às pequenas e médias empresas. Listou também a implementação de outras políticas para incrementar a economia, como o incentivo à contratação regular, e fomento à infraestrutura para gerar empregos em larga escala. “São basicamente mecanismos keynesianos [que recomendam maior participação do Estado como indutor do crescimento]. Mostrariam uma saída viável para essa situação, no curto prazo”, completou.

“Bomba fiscal”

Na análise do consultor econômico e coordenador regional da Abed (Associação Brasileira de Economistas pela Democracia) no Amazonas, Inaldo Seixas, fazer uma “mexida tributária” sem compensar Estados e municípios é “uma medida ruim”. O economista também, estima que o repasse ao consumidor será “pequeno” e pode até ajudar a arrefecer a inflação “um pouquinho”, repondo o IPCA novamente na casa de um dígito. Mas destaca que outros fatores estarão envolvidos nessa baixa.

“As empresas precificam o futuro e, se avaliarem que haverá um aumento no custo do combustível, não vão repassar inteiramente a diferença gerada pela redução do tributo. Pode ser que a inflação arrefeça um pouquinho nesse processo, mas será também por conta do aumento de safras, entre outros fatores. Mas, nada disso é seguro. Acredito que essa é uma medida eleitoreira, que transfere a bomba fiscal para Estados e municípios. Até porque a lei foi aprovada com muitos vetos”, explanou.  

Seixas lembra que setores como o de petróleo costumam ser muito taxados em outros países, em razão de seus impactos ambientais. Também estima que dificilmente a suposta folga de caixa gerada pela medida vai induzir mais aportes de capital. “O investidor não gosta desse tipo de gasto, que recai sobre o Orçamento Público. Temos o Risco-país subindo, por conta dessas subvenções, e isso pode aumentar o endividamento do Estado brasileiro, gerando mais dificuldade de oferta de serviços públicos. A economia não vai mudar significativamente, até porque temos incertezas políticas derivadas das eleições e temos que levar em conta a conjuntura mundial também. Se o ambiente fosse outro, até poderia ter impacto maior”, ponderou.    

“Alívio momentâneo”

A economista, consultora empresarial, professora e também integrante da seção regional da Abed, Denise Kassama, considera que a redução de tributos pode funcionar como “medida paliativa” e que seu impacto será mais significativo para profissionais que trabalham com frete de mercadorias e transporte de pessoas. “É um alívio momentâneo, mas não funciona por muito tempo. As cotações do petróleo estão em alta no mercado global. Daqui a pouco, vamos sentir um novo aumento”, alertou.

Denise Kassama aponta que a cadeia de custos dos combustíveis é “muito fechada”, o que dificulta soluções. “Sempre que se fala em reduzir preços, a única sugestão é a diminuição de tributos. Tudo bem que o custo de aquisição está subindo paulatinamente, mas a gente tem outros dispêndios envolvidos, como mão de obra, processos e outros insumos, que também deveriam ser verificados. Quando o mercado não permite o aumento de preços, o produtor revisa a cadeia de custos para manter a competitividade e até mexe na margem de lucro. Mas a Petrobras não vai querer falar disso”, lamentou.  

A economista lembra que o que gera crescimento é investimento e avalia que, além de não resolver os problemas de inflação e de PIB, mexer na arrecadação de ICMS é uma “medida temerosa”. “Parte desses recursos é destinada a munícipios onde a principal atividade econômica vem das próprias prefeituras, que dependem desses repasses. Essa iniciativa não é suficiente, porque a economia global está em desalinho e ainda sofre os efeitos da pandemia”, arrematou.

Marco Dassori

É repórter do Jornal do Commercio
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