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Baixa no crédito traz dúvidas sobre viés de alta

Baixa no crédito traz dúvidas sobre viés de alta

No rastro das quedas acumuladas da Selic, os juros dos financiamentos bancários emendaram a sexta retração consecutiva, em setembro. O movimento de baixa se deu em todas as linhas de crédito, para pessoas físicas e jurídicas, conforme dados da Anefac (Associação Nacional de Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade). Ao mesmo tempo, estatísticas do Banco Central informam que as concessões de crédito vem crescendo, ao mesmo que as taxas de inadimplência seguem trajetória inversa.

A entidade, no entanto, reforça que as condições econômicas para a manutenção do custo do dinheiro em patamares cadentes na ponta do consumo estão se deteriorando. Diante de um cenário de crescente endividamento público e falta de uma solução de continuidade para as políticas anticíclicas em favor de consumidores em situação de vulnerabilidade e empresas de pequeno porte depauperadas – pelo menos até que estas possam andar com as próprias pernas, a conclusão é que a aversão dos bancos ao risco tende a subir e suas restrições ficarem mais rígidas. 

Segundo a Anefac, o custo do dinheiro para pessoas físicas retrocedeu 0,54% e passou de 5,59% (agosto) para 5,56% (setembro) ao mês – o menor valor desde setembro de 2013. O decréscimo percentual para a média dos financiamentos a pessoas jurídicas foi bem maior e chegou a 1,37%, reduzindo a taxa de 2,93% para 2,89% mensais – o patamar mais baixo da série histórica. As respectivas taxas anuais ficaram em 91,42% e 40,76%. 

Por enquanto, o saldo das operações de crédito do Sistema Financeiro Nacional no Amazonas tem sido crescente, segundo os dados mais recentes do Banco Central. Para as pessoas físicas, os números de agosto (R$ 19,007 bilhões) foram 3,53% melhores do que os de julho (R$ 18,359 bilhões) e 13,38% superior aos registrados 12 meses antes (R$ 16,764 bilhões). Para as jurídicas, o volume do período (R$ 13,059 bilhões) cresceu 3,05% sobre o mês anterior (R$ 12,672 bilhões) e subiu 28,68% em relação a agosto de 2019 (R$ 10,148 bilhões).

Em sintonia, o índice de ICF (Intenção de Consumo das Famílias), medido pela CNC (Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo) confirma que a percepção majoritária entre as famílias de Manaus é que o acesso ao crédito ficou mais fácil. Aumentou de 49,3% para 60,3% a faixa de consumidores com essa avaliação, entre agosto e setembro. 

Mas, em termos proporcionais, o corte de 0,54% mensais tem potencial pífio para o meio de pagamento mais usado pelo consumidor manauense: o cartão de crédito, cuja taxa passou de 11,09% para 11,03% ao mês – ou de 253,26% para 250,98% ao ano. A mesma CNC indica, na pesquisa de ICF (Intenção de Consumo das Famílias), que o cartão de crédito é o maior vilão de endividamento e inadimplência, sendo responsável por 94,9% das dívidas na capital – com maior amplitude entre os que ganham mais de dez mínimos (97,6%).

A mesma base de dados do BC indica, por outro lado, que a trajetória da inadimplência nas operações de crédito no Sistema Financeiro Nacional vem sendo descendente no Amazonas. A taxa das pessoas físicas apresentou seu terceiro recuo seguido, entre julho (4,04%) e agosto (3,84%), mas segue acima da marca do mesmo mês de 2019 (3,74%). No caso das pessoas jurídicas, passou de 1,16% para 1,02%, na quarta baixa consecutiva e praticamente na metade do nível de 12 meses atrás (1,95%). 

Risco e repique

Diretor executivo de estudos e pesquisas da Anefac, Miguel José Ribeiro de Oliveira, reafirmou, no texto distribuído pela assessoria de imprensa da entidade, que a rebaixa nos juros se deve aos seguidos cortes da Selic e à expectativa dos agentes econômicos de que isso continue acontecendo, “frente a um cenário de inflação baixa e recessão econômica”. Em sua reunião mais recente, contudo, o Copom (Comitê de Política Monetária) resolveu manter a Selic em 2% ao ano – o nível mais baixo até hoje – e sinalizou que há poucos espaços para cortes. 

Oliveira, que também é o responsável pela sondagem, aponta ainda outros motivos, como redução dos depósitos compulsórios, operações de crédito com juros baixos e aportes do governo para pagamento das folhas das empresas pequenas e médias. A lista inclui também a renegociação de dívidas com remunerações menores e o cuidado dos bancos em não agravar ainda mais o quadro de inadimplência e solvência dos tomadores.

O dirigente considera, no entanto, que o horizonte para juros baixos continua fechando, em decorrência da deterioração do cenário econômico pela crise da covid-19 e o risco de crédito e da elevação da inadimplência. A tendência, segundo Oliveira, é de um repique mais cedo ou mais tarde. “Mas algumas ações do BC podem amenizar estas altas, como redução de impostos, compulsórios e reduções da Selic e por aí vai”, encurtou.

“Forças de mercado”

O presidente do Corecon-AM (Conselho Regional de Economia do Estado do Amazonas), Francisco de Assis Mourão Junior, discorda da avaliação da Anefac e avalia que as forças de mercado pendem para a continuidade das reduções de juros ou pelo menos para a estabilização em níveis baixos, até dezembro. O economista considera que o aumento da concorrência das fintechs, entre outros fatores de pressão de mercado, deve continuar garantindo a oferta no mesmo nível, a despeito dos eventuais temores da inadimplência.

“A taxa de inadimplência sempre foi muito alta no Brasil, então, creio que não há tanta preocupação assim. A demanda está crescendo, porque as pessoas que têm reservas aproveitam a redução das taxas para financiar a aquisição de imóveis, por exemplo. É claro que a prioridade é para o consumo básico e, diante da ameaça de uma segunda onda, muitos estão postergando os pedidos de crédito e até o pagamento de dívidas. Outros, já não têm mais capacidade de contratar novos empréstimos. Há fatores negativos, como a alta do dólar e dos preços dos alimentos, mas creio que os bancos não vão abrir mão de aproveitar esse momento”, concluiu.

Marco Dassori

É repórter do Jornal do Commercio
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