Acostumados com as paisagens vislumbradas a partir das montanhas da Europa, os colonizadores da Amazônia, que só podiam viajar pelos rios, construíram cenários distorcidos da região e cunharam a expressão “planície amazônica” que hoje não pode mais ser usada como um bom macro descritor regional. Além dos dois pontos culminantes do Brasil (Pico da Neblina e Pico 31 de Março) existem, na Amazônia, inúmeras elevações traduzidas por planaltos, serras, morrotes, morros e montanhas que se contrapõem às incontáveis depressões marcadas pelos acentuados baixios de terra-firme e os profundos vales afogados.
Esse relevo rugoso é decorrente da construção geológica e geográfica da região que teve, como grandes fatores, a deriva continental (mais intensa a partir da Era Mezozóica) e o surgimento da Cordilheira dos Andes (Era Cenozóica), fenômenos provocados pela separação dos continentes e pelo intenso vulcanismo, que formataram as complexas configurações físicas que serviram e servem de suporte para as formações e biológicas e humanas surgidas muito tempo depois.
A história biológica e humana
O surgimento da biota amazônica, segundo a Teoria dos Refúgios, no Período Quaternário (1,8 milhões até os dias atuais), por conta das cíclicas mudanças climáticas que provocaram transgressões e regressões marinhas, essas últimas responsáveis pela emersão de terras que estavam submergidas no imenso lago que preenchia a atual bacia amazônica.
O abaixamento do nível do mar fez surgir uma grande quantidade de ilhas e pequenos lagos (refúgios) onde a evolução biológica deu origem à enorme diversidade de organismos que se expandiram para toda a região, quando o clima do planeta se estabilizou por volta de 11 mil anos atrás. A espécie humana, segundo os vestígios antropológicos, só chegou à Amazônia depois dessa estabilização climática e os caminhos de sua entrada ainda são obscuros prevalecendo a teoria de que os primeiros habitantes chegaram à América do Sul através do Istmo do Panamá, vindos da América do Norte que alcançaram depois de atravessar o Estreito de Behring, por volta de 30 mil anos atrás.
Diversidades Amazônicas
Essa multivariedade de cenários, brevemente sinalizados nos itens anteriores, tipifica a Amazônia como um centro dominado e caracterizado por inúmeras diversidades como a física/natural, a étnica, a social, a cultural, a histórica, a econômica, a biológica e, nesse sentido, a expressão “diversidades amazônicas” parece ser um macro descritor regional muito mais apropriado do que “planície amazônica” já que a planície é apenas um aspecto da diversidade física/natural.
A Amazônia intangível
As variedades paisagísticas (“lato sensu”), humanas e biológicas, embora possam ser materialmente descritas, constituem um sistema natural cujos maiores efeitos não são tangíveis, isto é, não têm existência física. Os bens e os serviços ecológicos prestados pela Amazônia são bens da União, embora sua estrutura e funcionalidade não sejam determinadas pelas leis humanas. A Constituição Federal e toda a legislação ambiental brasileira reconhecem essa intangibilidade, inserindo os elementos das diversidades amazônicas como patrimônio do povo brasileiro e as benesses ambientais por elas produzidas, como direito individual e/ou coletivo.
A Amazônia intangível, portanto, tem sua importância e seus recursos naturais situados dentro de limites que não podem ser ultrapassados pelas normas do modelo socioeconômico que só objetiva a acumulação de riqueza, muitas vezes policialmente tangíveis. As diversidades amazônicas são tão complexas que só o conhecimento científico, dentro de uma visão interdisciplinar, pode entender a importância de suas estruturas e funções, tanto para o ecossistema regional como para a manutenção do fenômeno da vida no planeta. As ameaças externas são reais e não vão ser repelidas com o simplório e arrogante discurso dos governantes, nem resolvidas com as medidas superficiais que tipificam os projetos de governo