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‘Amazonas tem vocação para indústria de games’ diz Olímpio Neto

Se outros segmentos da economia sentiram na pele os impactos da retração com a pandemia, a indústria criativa, de entretenimento, não tem o que reclamar. O isolamento social impulsionou tanto os negócios que se desenha a cada dia um futuro promissor, gerando mais empregos e renda.

São dezenas de aquisições e fusões de startups que acontecem a cada semana no âmbito do mercado bilionário que mais cresceu nos últimos dois anos. Confinadas em casa, as pessoas recorreram a games, a plataformas de streaming, para compensar o tédio de não fazer nada, engordando os lucros das empresas do setor.

Frutos dessas bem-sucedidas atividades artísticas digitais, os videogames encantam hoje até pessoas da terceira idade. Não só crianças manipulam e se divertem com universos de histórias trazendo conteúdos empolgantes para todas as faixas etárias. E lá também estão os mais idosos, concentrados, entretendo-se. Tudo muito prazeroso!

“Nas últimas décadas, o videogame viralizou. É um mercado excelente, bastante promissor, mas que não tem a contrapartida de políticas públicas. Temos muitos talentos, mas essa mão de obra continua invisível, sem praticamente interesse de medidas governamentais”, diz Olímpio Neto, CEO da produtora Petit Fabrik. “O Amazonas tem vocação para a indústria de videogames”, acrescenta ele.

De uma pequena sala no bairro Coroado 3, na zona leste de Manaus, a empresa se expandiu, ganhou ares de grandes negócios em tecnologia. É hoje é referência na produção de videogames em todo o Brasil.

Seu último jogo Kukoos-Lost Pets está entre os oito selecionados no BIG Festival 2021, o maior realizado pelo segmento de games da América Latina. Segundo Olímpio Neto, faltam profissionais para atender às demandas da indústria criativa no Amazonas. Para cada 100 vagas, existem, no máximo, dez que possuem essa formação.

“As empresas estão guerreando para contratar pessoas qualificadas na área”, afirma o CEO da  Petit Fabrik. E o salário também é atraente. Um profissional pode ganhar de R$ 10 mil a R$ 15 mil por mês, garante o CEO.

Apesar de ser um dos maiores consumidores de videogames, o Amazonas (e o Brasil como um todo) ainda estão, porém, muito atrasados na indústria de entretenimento, ressalta Olímpio Neto.

Ele falou com exclusividade ao Jornal do Commercio.

Jornal do Commercio – O mercado de videogames está cada vez mais presente. Ainda tem muito a oferecer?

Olímpio Neto –O ato de jogar é uma coisa muito natural para o ser humano. Lógico, nas últimas décadas o videogame viralizou. Logo teremos pessoas com a cabeça branquinha jogando. É um mercado excelente, que cresce cada vez mais

Apesar das dificuldades por conta da pandemia, a indústria conseguiu continuar produzindo normalmente. O Brasil é um dos maiores consumidores do mundo desse segmento.

Mas ainda falta muito, porém, para se tornar um dos maiores produtores de videogames.

JC – O jogo da empresa figura entre os oito melhores selecionados no BIG Festival 2021, o maior do segmento de games da América Latina. Como avalia essa experiência?

Olímpio Neto -O festival é muito importante. A primeira edição foi em 2011, e nós vencemos. E, este ano, fomos selecionados entre os oito principais jogos brasileiros que serão lançados em 2021.

O jogo foi desenvolvido em parceria com o PPED (Programa Prioritário de Economia Digital), IDD (Instituto de Desenvolvimento Tecnológico) e a FPF (Fundação Paulo Feitoza), viabilizando um superprojeto de games, um dos mais robustos que acontecem hoje no Brasil.

O projeto envolveu aproximadamente 40 pessoas, entre roteiristas, artistas, desenvolvedores. É um time multidisciplinar. E é uma honra estar aqui no Amazonas levando tecnologia de ponta para entretenimento e qualidade de altíssimo nível.

E ter essa vitrine no festival é muito importante pra gente.

JC – Como é o nome do jogo….?

Olímpio Neto – É o Kukoos-Lost Pets, um jogo em plataforma 3D. Criamos todos os personagens da história. Nosso estúdio acredita na força de criar marcas que possam ser lembradas. Que a gente possa contar histórias.  Está dentro da estratégia da empresa.

JC – E quem ganha no jogo….?

Olímpio Neto –Pula-se de uma plataforma pra outra. O jogador controla seu personagem, vai vivendo suas aventuras em vários mundos e com temáticas diferentes.

O jogo é uma história que começa com os pets em uma grande festa na ilha dos kukoos.  De repente, todos os pets ficam meio loucos, meio alucinados, e são sequestrados.

E o jogador vai resgatando os pets, vivendo a história, até que chega o final. Não posso contar o final (rsss).

JC – Se alguém se inspirasse ‘no Olímpio Neto’ e perguntasse como entrar nessa carreira, principalmente os mais jovens, qual a orientação que daria?

Olímpio Neto – Gosto muito de falar desse assunto. Essa empresa começou no Coroado 3, bairro onde cresci e vivi minha vida toda até me casar.

Começamos em uma salinha pequena. E espero que sirva pra inspirar muitos outros jovens no Amazonas.

O Amazonas tem uma vocação para matrizes econômicas como essa de videogames. Não polui, não destrói a natureza e gera um volume financeiro enorme.

Temos muita gente talentosa aqui. Mas falta tudo – formação, políticas públicas, iniciativa pública pra treinar esses jovens.

Ao longo de anos, conheci dezenas de artistas. Alguns estão, Inclusive, trabalhando hoje no exterior. E ninguém sabe. É uma área bastante promissora. Não conheço ninguém desempregado. As empresas de tecnologia estão guerreando por profissionais.

Tem 100 vagas pra dez artistas desenvolvedores de game. E a tendencia é piorar. Não há pessoal suficiente para atender a esse mercado.

Podemos chegar a mil vagas e só existirem esses dez desenvolvedores.

Sem exagerar, o mundo inteiro está guerreando por esses talentos. Um jovem pode ganhar seus 8 mil reais, 15 mil reais, mensalmente.

Eles (os jovens) não transformariam só o grupo imediato, mudariam toda a condição social de muitas famílias. Esta é a realidade.

 JC – E o que está faltando para alavancar esse mercado e permitir que mais jovens se interessem pelas atividades…..?

Olímpio Neto– Temos excelentes faculdades que formam profissionais como a UEA (Universidade do Estado do Amazonas) e a Ufam (Universidade Federal do Amazonas).

Mas temos menos formação pra quem é da área de arte 3D e computação gráfica.

Mas mesmo assim não é suficiente. Não é só o Amazonas, mas também em todo o Brasil. O que vemos é a iniciativa privada se envolvendo diretamente na formação de mão de obra, alinhada com a iniciativa pública, pra treinar pessoas talentosas.

O mercado de trabalho está clamando por essa mão de obra que é insuficiente.

JC – Concluído o ensino médio, que instituições recomendaria a um jovem interessado na formação para a indústria criativa, de entretenimento?

Olímpio Neto – As coisas têm mudado bastante nos últimos anos. Existem muitos cursos online. É muito importante dominar o inglês que pode abrir muitas portas.

Vai muito do interesse da pessoa em buscar a sua formação. Tem o google, o youtube.

Na minha época, a única coisa que conheci mais próxima do google foi a Enciclopédia Barsa. Hoje as pessoas aprendem muita coisa grátis no google, no youtube.

Deve investir no inglês. Mas como um menino de periferia vai investir no inglês?

Precisa de uma visão de política pública pra viabilizar essa possibilidade. Porque talento tem de sobra. Quem tem vontade, tem que correr atrás. Tem muito espaço online pra isso.

JC – A ZFM tem sido a maior fonte de receita do Amazonas. Mas é alvo de ameaças a todo instante. Fala-se, hoje, em novas matrizes econômicas que viriam a se somar a essas atividades industriais. O que falta para viabilizar um polo digital na região?

Olímpio Neto – Temos tudo pra ser um polo digital. Manaus reúne as mesmas características do Vale do Silício que muitas cidades brasileiras não têm.

Temos um volume de dinheiro enorme que circula em nossa cidade. Um paralelo difícil pra se reunir só numa cidade.

Mas não existe capilaridade pra esses recursos chegarem aos pequenos negócios.

As grandes indústrias ganham dinheiro aqui há décadas, crescem e vendem pro mundo.

Um mundo digital não pode ficar desconectado das pequenas empresas, das startups. Empresas que valem 100 mil reais podem fazer 100 milhões de reais lá adiante.

Esse é o business. Vou fazer um paralelo com o filme ‘Meu malvado favorito’. Não é o melhor produção de animação do mundo, mas faturou 1,2 bilhão de dólares de bilheteria, sem falar de licenciamento de produtos com potencial enorme. Esse dinheiro daria pra cobrir todo o orçamento anual de Manaus, em tudo.

Nosso potencial é altíssimo, mas não temos a atenção devida pra impulsionar os negócios. Temos que criar um ambiente favorável para um produto global.

JC  – O novo game da empresa poderia ser esse produto global….?

Olímpio Neto – Essa é a nossa aposta. Começamos em 2007 sonhando em fazer séries de TV em  animações.

Já temos a série de TV no ar chamada ‘Lupita no planeta’ e ‘Lupita pelo mundo’. Está disponível online.

No ano passado, vencemos o Festival de Gramado com a melhor série de animação brasileira. Fomos finalistas do Grande Prêmio do Cinema Brasileiro.

É a nossa primeira série. Passei anos com essa produção debaixo do braço e ninguém botava um real nela. Ninguém abraçava a ideia.

Vencemos um edital público – olha aí a iniciativa pública fazendo a diferença. E colocamos no ar a ‘Lupita’, que já está passando na China, em vários lugares da América Latina e nos Estados Unidos.

JC – Como avalia a necessidade de políticas públicas para alavancar novas atividades no Amazonas e não ficar só  dependente do repasse obtido pela ZFM?

Olímpio Neto – É até redundante, um clichê, ser necessário dar uma maior atenção à tecnologia. É um problema sistêmico nosso.

Ninguém está discutindo profundamente as tecnologias. As iniciativas costumam ter sempre um viés político. Falam em educação, saúde, esse discurso clássico.

Mas não falam como podemos tornar o Amazonas desenvolvedor de tecnologias, não só o Amazonas, mas também outros Estados.

Claramente, não é prioridade. Ninguém vai a fundo. Mas é uma necessidade real.

Nos últimos anos, temos visto uma espécie de caça às bruxas na nossa indústria. Demonizaram as políticas públicas de incentivo à cultura, à indústria criativa.

Se eu dependesse disso pra viver, tinha falido. A gente precisa de políticas públicas. Todo mundo que a gente admira como Israel, Estados Unidos, têm políticas públicas. Mas o Brasil está desconectado dessa realidade. Não existe política pública pra indústria criativa.

JC – Muitos dizem que os videogames viciam as crianças. Qual a sua opinião sobre isso?

Olímpio Neto – Os jogos têm faixas etárias, mas os pais não respeitam. Esse é um primeiro problema. Eles são muitos.

Existe uma transferência de responsabilidade. Os pais têm que acompanhar os filhos, verificando o tempo todo os jogos adequados para eles.

Jogar é como comer chocolate. A exposição a telas, como qualquer outra atividade prazerosa, pode gerar vícios. Trinta anos atrás, tinha menino que se viciava em jogar bola, parava de estudar.

Então, faz muita diferença o papel da família. Mas o jogo agrega bastante. Ensina lógica, tem muita coisa boa. É como um filme, uma série.

A gente como desenvolvedor tem que ser responsável em criar bons conteúdos pra cada faixa etária. As famílias precisam se envolver também nesse processo.

JC – Vivemos uma pandemia. De certa forma, a crise tem fomentado tecnologias, levando as pessoas a buscar mais os canais digitais. Isso serviu para dar um aquecimento no mercado?

Olímpio Neto – Sim. É muito difícil dizer que tem um lado bom da pandemia. Muitos morreram, ficaram doentes.

Mas a crise obrigou as pessoas a ficarem mais tempo em casa. E a indústria de entretenimento foi fundamental para esse isolamento social.

Músicas, filmes, jogos, séries novas, tudo isso ajudou muito a gente a sobreviver. Essa indústria começou a ser vista com bons olhos. No final, todo mundo precisa.

Se mostrou uma indústria necessária pra nós, humanos No lado de negócio, ficou claro que a indústria suporta a pandemia.

A nossa empresa está trabalhando há mais de um ano em home office. Nunca se falou tanto em fusões e aquisições de empresas. Elas acontecem a cada semana nesse mercado bilionário de games.  

É um segmento que aqueceu demais. Teve um impacto gigantesco. Então, por que o Amazonas não pode virar um grande centro de tecnologia mundial?

Foto/Destaque: Divulgação

Marcelo Peres

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