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Alta inflação de alimentos e combustíveis leva o Copom a aumentar a Selic

Como já era aguardado pelo mercado, a alta da inflação de alimentos e de combustíveis e de outros itens básicos levou o BC (Banco Central) a retomar a política de alta de juros, pela primeira vez, desde julho de 2015. Por unanimidade, o Copom (Comitê de Política Monetária) decidiu, nesta quarta (17), elevar a taxa Selic, de 2% para 2,75% ao ano. O reajuste, contudo, veio mais forte até mesmo do que o aguardado pelos analistas financeiros –cuja expectativa era um acréscimo de meio ponto percentual, no máximo.

Embora concordem que a inflação está avançando em patamar acima do desejável, dirigentes classistas ouvidos pela reportagem do Jornal do Commercio foram unânimes em concluir que a autoridade monetária mirou no alvo errado, uma vez que o atual processo inflacionário se dá pela escalada do dólar, e não pela demanda, que se encontra desamparada pelos impactos da segunda onda de covid-19 em todo o país, e pela falta de estímulos federais para conter os efeitos econômicos da pandemia.  

Em comunicado, o BC informou que o reajuste da Selic reduz a probabilidade de não cumprimento da meta de inflação deste ano e ajuda a manter as expectativas para horizontes mais longos. Segundo o Copom, a estratégia é compatível com o cumprimento da meta em 2022, mesmo em um cenário de aumento temporário do isolamento social.

Em fevereiro, o IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo) fechou em 5,2% no acumulado de 12 meses –valor próximo do teto da meta de inflação –, puxado pelas altas do dólar e dos preços de alimentos e combustíveis. De acordo com o boletim Focus, pesquisa semanal com instituições financeiras e divulgada pelo BC, a inflação oficial deverá fechar o ano em 4,6%.

O BC adiantou que pretende elevar os juros em mais 0,75 ponto percentual na próxima reunião do Copom, marcada para 4 e 5 de maio. “Para a próxima reunião, a menos de uma mudança significativa nas projeções de inflação ou no balanço de riscos, o Comitê antevê a continuação do processo de normalização parcial do estímulo monetário com outro ajuste da mesma magnitude”, ressaltou o texto.

“Demanda decrescente”

No entendimento do presidente da Fieam (Federação das Indústrias do Estado do Amazonas), Antonio Silva, antes de corrigir a Selic, o BC poderia ter aguardado os reflexos das medidas restritivas mais severas impostas em todo o país, em face do agravamento da pandemia. O dirigente destaca ainda o efeito da variação cambial na “escalada contínua dos preços”.

“As medidas de restrição, por si só, devem ter um impacto no consumo e, consequentemente, deverão refrear o aumento nos preços. Assim, ao sopesarmos a natural retração, ante às medidas de isolamento, a variação do câmbio e o aumento da Selic, temos um cenário altamente adverso, que deve induzir resultados ainda mais negativos que o esperado”, alertou.

Na mesma linha, o presidente do Cieam (Centro da Indústria do Estado do Amazonas), Wilson Périco, reforça que a demanda é decrescente nos gêneros que compõem o IPCA, em virtude do desemprego, “que está grande”. O dirigente aponta que itens que têm puxado para cima a variação do indicador do IBGE, a exemplo de insumos agrícolas e combustíveis, têm tido seus preços vitaminados pela alta do dólar.

“O mesmo ocorreu aqui, no PIM. Veja os dados da Suframa sobre o faturamento em 2020, onde os números batem recorde em reais. A composição dos custos dos produtos vem dos insumos importados, que são precificados em dólares. Esse custo cambial foi para o preço dos produtos. Mas, quando você faz a mesma comparação do faturamento em dólares, ficamos dois dígitos abaixo da marca de 2019”, exemplificou.

Indagado sobre os efeitos aguardados do encarecimento do dinheiro na atividade industrial, ou em que prazo estes viriam, o presidente do Cieam disse que é difícil precisar se haverá algum impacto, de fato, já que “a Selic continua baixa, mesmo assim” .

Em sintonia, o presidente da Eletros (Associação Nacional de Fabricantes de Produtos Eletroeletrônicos), José Jorge do Nascimento, também avalia que o momento do aumento da Selic não foi adequado. O dirigente argumenta, por outro lado, que o câmbio alto pressupõe um casamento com Selic baixa, para evitar escalada de preços nas partes e peças utilizadas pela indústria, assim como em seus bens finais.

“A partir do momento em que os juros começam a subir, com um dólar ainda muito valorizado, a gente começa a ter um impacto muito ruim na economia. Realmente a gente hoje sofre uma pressão muito grande no preço dos insumos. Acho que o governo deveria aguardar um pouco mais para tomar essa decisão. Agora, a inflação tem aumentado, com os preços dos insumos crescendo a cada dia. E isso é extremamente preocupante”, frisou.

“Incentivo à especulação”

O presidente em exercício da Fecomércio AM (Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado do Amazonas), Aderson Frota, também considerou que o reajuste da Selic não foi uma boa ideia para a atual conjuntura de segunda onda, câmbio apreciado e desemprego em alta. Na avaliação do dirigente, além de vir em hora errada, o aumento foi excessivamente elevado e “fora do padrão”, dando mais respaldo a aplicações financeiras do que aportes em produção ou aumento do consumo.

“Há o pressuposto do Ministério da Economia de que a economia está aquecida e que vivemos um processo inflacionário. Mas, o que vemos é muito diferente: vários Estados estão colapsados pela pandemia e com as atividades já paralisadas, ou sob ameaça de restrições. A retomada precisa de crédito, para garantir investimentos e empregos. Tirar dinheiro do mercado só vai incentivar a especulação. Esse aumento da Selic não se coaduna com o momento”, lamentou.

O presidente do Sinduscon-AM (Sindicato da Indústria da Construção Civil do Amazonas), Frank Souza, disse que a elevação da Selic já era previsível e lembra que há uma expectativa de que a taxa chegue aos 4,5%, até o final do ano. Embora avalie que a escalada inflacionária dificultava a continuidade de um cenário de juros no piso histórico, o dirigente antevê dificuldades para o setor, que trabalha no longo prazo e com produtos que necessitam de crédito e confiança para sustentação de vendas.

“Está havendo um aumento muito grande de preços e não tinha jeito de manter a Selic. Agora, é ruim porque vai aumentar os juros na ponta e o valor da prestação dos imóveis. Possivelmente, vamos ter diminuição nas vendas. Essa combinação de falta de emprego com elevação de taxas a pagar é complicada. A gente espera que a economia se estabilize, para que as empresas possam trabalhar com maior previsibilidade para o longo prazo. Atualmente, estamos vivendo na base do sobressalto”, arrematou. 

Foto/Destaque: Divulgação

Marco Dassori

É repórter do Jornal do Commercio
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