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‘Alguém poderoso está por trás da onda de violência’, diz Amadeu Soares

Ex-secretário de Segurança Pública do Amazonas, o coronel Amadeu Soares avalia que faltaram ações de inteligência para frustrar os atos criminosos que espalharam o terror em Manaus e em várias cidades dos municípios do interior.

Durante dois dias consecutivos (sábado e domingo), a cidade foi sacudida por uma violência desenfreada que mostrou a grande fragilidade existente  hoje no aparato de segurança para estabelecer a ordem, cumprindo a sua função constitucional – de preservar a vida da população e os patrimônios públicos.

Para o coronel Amadeu Soares, a inteligência da polícia deveria ter logo entrado em ação após a morte do traficante conhecido como ‘Dadinho’ durante enfrentamento com policiais militares. A partir daí, vieram todas as sequências de episódios que culminaram com incêndios de ônibus, ataques a delegacias de polícia, depredação de vias públicas, de praças e de outros logradouros da cidade, obrigando as autoridades a decretar um  lockdown para preservar a integridade da população.

“O setor de inteligência não forneceu nenhuma informação que pudesse municiar o secretário para prevenir  os ataques que atingiram uma proporção inimaginável. A segurança não pode se ajoelhar diante do crime. Isso não existe”, ressalta o coronel.

Segundo ele, gerenciar o combate ao crime sem planejamento, sem investimentos em mais infraestruturas, aliados a ações de inteligência, é como mergulhar no caos um setor tão importante para a sociedade.

O coronel ressalta que as ações das facções devem ser atacadas na base, mantê-las sob um rigoroso controle, impedindo que elas angariem cada vezes mais recursos e possam cooptar novos integrantes.          

“Não se pode admitir cercear o direito de ir e vir das pessoas com essa explosão de violência que aconteceu no final de semana em Manaus, paralisando serviços essenciais e obrigando a população a ficar em casa”, acrescenta o ex-secretário.

Amadeu Sores diz ser necessário identificar os mandantes dos atos criminosos. Ele diz que as pessoas presas suspeitas de envolvimento na onda de violência no Estado são apenas ‘piabinhas’.  “Alguém poderoso, forte e com grande tráfico de influência está por trás desses atentados”, acrescenta. “Precisamos identificar e punir”, afirma.

O coronel falou com exclusividade ao Jornal do Commercio.

Jornal do Commercio – Como especialista, como avalia esses episódios envolvendo atos criminosos que a cada dia ganham mais visibilidade, notoriedade, reivindicando áreas, espalhando o terror à população do Estado. Como como explicar à sociedade esse tipo de fenômeno.

Amadeu Soares – Essas organizações criminosas têm duas galinhas de ovos de ouro – que são o tráfico de drogas e o tráfico de armas.

Afora isso, a criminalidade em geral que ocorre nos bairros com a prática de roubos, furtos, entre outros delitos que estão envoltos com esse tipo de crimes.

A missão da Secretaria de Segurança Pública e das Forças de Segurança é manter isso sob um controle rigoroso. Não deixar que eles extrapolem e consigam interromper o direito de ir e vir das pessoas ou que eles implantem o terror como fizeram no fim de semana

Sempre gosto de partir da premissa dos fatos. Na última sexta-feira, um grupo desses pintou um muro lá no bairro da Redenção, dizendo que a área já é deles.

Hora depois, uma tropa da Rocam entra no bairro, deu uma sitiada, culminando material apreendido e a morte do traficante conhecido como ‘Dadinho’.

A partir dessa ação, a a inteligência da polícia deveria ter entrado em ação, assessorando o o secretário para prevenir esses atos, impedir retaliações.

No entanto, isso n não ocorreu. Quando as coisas começaram a acontecer é que eles foram se organizar, dando condições para a explosão  da violência.

O Ministério Público determinou uma investigação séria, transparente, para demonstrar à  sociedade o que de fato aconteceu,  quem foram os culpados e as punições que eles sofrerão.

JC – Mas isso, inclusive, o governo apresentou as pessoas que foram presas envolvidas nesses episódios que podemos chamar de atos terroristas….De alguma forma, isso poderia ser mais  esclarecido ou há um certo receio de muitos denunciar integrantes da polícia que de repente possam estar ligados a esses grupos criminosos. Como fica  essa situação?

Amadeu Soares – Por isso que defendo uma investigação séria, competente e transparente. Quem executou cumpriu ordens. Temos que chegar a quem deu a ordem.

Precisamos responsabilizar as pessoas que estão envolvidas com eles, tirar das corporações e responsabilizar.

Por que se não vai continuar acontecendo. Se não for cortado o mal pela raiz, a tendencia disso é sempre acontecer.

Além disso, nós vamos com mais  de 11 anos sem concurso público para a Polícia Militar, Polícia Civil e corpo de Bombeiros. Esses quadros precisam ser repostos.

Eu vejo com muito bons olhos a questão da municipalização da segurança pública. Porque tudo só nas costas de um ente federativo pesa muito.

JC -As forças de segurança precisam monitorar as facções para que as ações desses grupos não extrapolem. Por que não acabar logo com elas que proliferam como ratos, principalmente em  locais considerados áreas vermelhas?

Amadeu Soares – Na verdade, eu acredito que aqui tem que ser feito como aconteceu na Colômbia. Medellin era a cidade onde Pablo Escobar morava

Lá quem fazia a lei era ele, é como acontece aqui agora, com as facções demonstrando um poder paralelo. Mas por que acontecia isso? Porque ele (Pablo Escobar) tinha a conivência do governo, havia conveniências de agentes púbicos com ele

Ele tinha informações privilegiadas da justiça, do governo, do município e de todos os órgãos públicos.

Ele aparelhou os criminosos com o aparelho do Estad. Por isso que se chama crime organizado. Isso daí é que tem que ser combatido de imediato no Amazonas.

Esse contágio não pode ser ampliado porque, à medida que ele for crescendo, vai reduzindo a ação das forças de segurança.

É o que mais ou menos eu penso o que está acontecendo hoje  aqui no Estado.

JC – Então, o Ministério Público deveria ter um grande protagonismo de ser um mediador nessa relação para exatamente tentar tirar essas frutas podres do meio do cesto….

Amadeu Soares – Quando falo que é preciso haver um grande controle que são as prisões que são efetuadas. O tráfico de drogas é um mercado que é regido por uma coisa  muito básica que é a lei da oferta e da procura

Não acredito nessas ‘piabas’ que foram presas….Alguém deu ordem, alguém mandou, alguém com muita estrutura, muito força e muito tráfico de influência…

JC – Falando ainda sobre a municipalização, o prefeito vem apressando essa questão que vem desde a campanha eleitoral. O assunto é ponto pacífico de que é preciso armar a Guarda Municipal. Mas como dar esse salto na questão sem a contrapartida de investimentos para contratação de pessoal?

Amadeu Soares – Eu acredito que 70% da Guarda Municipal da prefeitura de Manaus é LDA e 30% são efetivos. Mas são pessoas com idade já bastante avançada.

Acredito ser necessário realizar um concurso público para contratação de novos guardas municipais.

O prefeito David Almeida pode seguir o exemplo do ex-prefeito de São Paulo Gilberto Kassab que comprou horas-extras de policiais militares enquanto prepara a nova guarda, dando treinamento como equipamentos mais modernos, armamentos novos.

Será preciso  também colocar câmeras de monitoramento da cidade, construindo

Não pra montar uma polícia de enfrentamento porque essa daí já tem. Precisa montar uma política protetora, comunitária que proteja os passeios púbicos, as praças e os locais onde a sociedade costuma frequentar. Mas é preciso que se dê essas condições

Por exemplo, tinha guardas municipais na Bola das Letras que foi atacada pelos criminosos. Mas só  que eles estavam desarmados.

Não vejo que a forma açodada de fazer as coisas seja a mais correta. O Estado precisa se estruturar pra dar esse treinamento.

O que aconteceu aqui é inimaginável, jamais imaginar que a estrutura de segurança pública vai se ajoelhar para o crime.  isso não existe.

Quem comunga disso aí entregue o chapéu e vai exercer outra profissão.

JC – Falou-se inclusive de intervenção e ainda da cooperação com a vinda da Força Nacional. Acha que é suficiente para apagar esse incêndio….?

Amadeu Soares – A Força Nacional é um paliativo, vai agir sobre os efeitos. Precisamos identifica a causa e responsabilizar criminalmente os responsáveis. Então, age-se na causa e nos efeitos. Só a Força Nacional não adianta. Daqui a pouco ela vai embora e a gente vai ficar vulnerável de novo.

JC – O Ronda no Bairro demonstrou eficiência, mas de repente parou. Por que acabou, deveria haver um programa semelhante?

Amadeu Soares –   A segurança pública é um sistema, começa na base.  São três malhas que geram demandas. O Ronda no Bairro agia aí na base, caminhava nessa direção. Foi preparado tudo para uma política pública e não do governo. Mas não teve continuidade.

Hoje não se vê nenhum programa estruturante de segurança pública Quem não trabalha com planeamento vai gerenciar o caos. Só se ve a segurança púiblcias sendo conduzida pelos fatos = Todo o tempo apagando incêndios e uma hora a água acabar. E  aí?

JC – Falando sobre investimentos e planejamento, lembramos que o governo  Amazonino Mendes fez uma parceria com a empresa Giuliani Security & Safety. O que ficou dessa experiência e qual a contribuição dessa expertise para o sistema de segurança do Estado?

Amadeu Soares – O projeto estava concluindo a fase diagnóstica. Então, precisava conhecer os problemas para apresentar algumas soluções de curto, médio e longo prazos. E isso sendo feito de forma estruturante. Então, precisava fazer tudo isso para só depois captar os investimentos que já estavam em sua fase inicial e reorganizar essa infraestrutura.

O que se iria fazer com as fronteiras, os presídios e com o aparelho de segurança pública. São essas três vertentes que se estava trabalhando com mais veemência. Mas se tivesse  sido dado sequência ao programa, já estaríamos com muita coisa implantada.

Não se percebe até hoje vontade política para fazer isso. Muito pelo contrário, se apressaram em engaveta o que ficou e criticar o que estava sendo feito. O  que foi apresentado no lugar? Absolutamente nada.

JC – Ainda sobre a infraestrutura, o policiamento dá conta daquele ‘varejo’, na base, mas de repente a justiça vai e solta, incentivando essa perpetuação do crime. Agora estão querendo reformular o Código Penal. Em vez de endurecer, parece que querem mais flexibilizar as leis. A polícia fica na situação de enxugar o gelo. Como avalia essa situação?

Amadeu Soares – Esse assunto tem que ser abordado de três maneiras. É um tripé de qualquer governo – educação, saúde e segurança pública. Os três não podem estar mal nunca porque senão a sociedade vai pagar um preço caro. E a educação é a tecla que costumo bater – precisamos investir pesado na educação pra construir uma sociedade lá no futuro bem melhor.

E construindo uma educação de qualidade, você também está construindo uma segurança pública de qualidade.

JC – Vimos nesse episódio da pandemia uma insuficiência da polícia para atender a tantas demandas. Ficaram muito latentes as dificuldades em dar essas contribuições….

Amadeu Soares – Precisamos de fato fazer justiça com a Polícia Mlitar. Ela foi utilizada indevidamente pra perseguir trabalhador. Mas ela estava de pé pra enfrentar criminosos.

A polícia integra a sociedade e precisa ser alijada. Precisamos  de mais policiais que só v virão com os concursos públicos

É um orgulho ter uma ótima estrutura de segurança públicos para a sociedade, permitindo que as pessoas caminhem pelas ruas tranquilamente. Esta é a cidade  que gente quer.

Foto/Destaque: Divulgação

Marcelo Peres

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