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A antiga Travessa dos Inocentes, em Manaus

No período Colonial brasileiro os enterros seguiam uma hierarquia. Enquanto os administradores públicos, membros do Clero e da elite eram enterrados no interior das Igrejas, próximos do altar, em seus átrios e em catacumbas, os escravos, criminosos, não-cristãos, suicidas, pagãos e pessoas humildes eram sepultados em terrenos improvisados, em valas comuns ou atirados nas estradas ou no mar, estes últimos casos sendo frequentes com os escravizados. Poderiam ocorrer exceções caso a pessoa, escrava ou livre de baixa renda, fizesse parte de alguma Irmandade Católica que possuísse capela própria ou um lugar reservado em Igreja Matriz para realizar os enterros de seus membros (BRAVO, Milra Nascimento. A morte hierarquizada: os espaços dos mortos no Rio de Janeiro Colonial (1720-1808). Revista do Arquivo Geral da Cidade do Rio de Janeiro, n. 08, 2014, p. 307-329).

A rua Visconde de Mauá, localizada no Centro Histórico de Manaus, no antigo bairro de São Vicente, era conhecida, entre o final do século XIX e início do século XX, como rua Demétrio Ribeiro em homenagem a Demétrio Nunes Ribeiro (1853-1931), jornalista, engenheiro, político e Primeiro Ministro da Agricultura entre 1889 e 1890 (MONTEIRO, 1998, p. 203-204). Em um passado ainda mais remoto, nos tempos da Capitania de São José do Rio Negro, quando a cidade era o simples Lugar da Barra, era conhecida como Travessa dos Inocentes. Quem nos explica essa nomenclatura é o médico e historiador Antonio José Souto Loureiro no livro Histórias Esquecidas, publicado em 2018:

“[…] a antiga Rua Demétrio Ribeiro, hoje Visconde de Mauá, que passava nos fundos da Matriz Velha de Manaus, recebeu o nome de Travessa dos Inocentes, na época colonial, pois ela correspondia ao dito cemitério dos pequeninos pagãos, que haviam deixado chorosas mães, tristes pelas suas prematuras partidas, sem o lenitivo do batismo” (LOUREIRO, 2018, p. 29).

Loureiro registra, ainda, que “Dizem que quem por ali anda às horas mortas, nas noites de chuvas e ventos, sem luar, ainda ouve o choramingar dos pequeninos, pedindo um abrigo, na velha igreja, hoje desaparecida após um incêndio, ou o soluçar de suas mães a procura do curumim perdido (LOUREIRO, 2018, p. 29-30).

O historiador Mário Ypiranga Monteiro (1909-2004), em seu Roteiro Histórico de Manaus (1998), questiona se o nome seria em homenagem ao Frei José dos Santos Inocentes, que morava ao lado da antiga Igreja de Nossa Senhora da Conceição, incendiada em 02 de julho de 1850, ou por causa do cemitério (MONTEIRO, 1998, p. 348).

Possivelmente a Travessa dos Inocentes homenageava, de fato, os pequenos pagãos, e não o Frei José dos Santos Inocentes, pois naquela região ficava um dos primitivos locais de enterro do Lugar da Barra, com os brancos – explica Agnello Bittencourt no livro Fundação de Manaus – Pródromos e Sequências (1969) – enterrando seus mortos ao redor da antiga Igreja de Nossa Senhora da Conceição e os indígenas os seus na área que ia da Fortaleza à rua de São Vicente, hoje Bernardo Ramos (BITTENCOURT, 1969, p. 32-33).

Foto/Destaque: Divulgação

Fábio Augusto Carvalho

é historiador
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