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“Não entendo o motivo para tão pouco desenvolvimento no interior”

A deputada estadual Vera Lúcia Castelo Branco (PTB), que se reelegeu com quase o dobro de votos de seu primeiro mandato (24 mil contra l4 mil, aproximadamente), manifestou-se indignada com os problemas enfrentados pelas indústrias, ultimamente. Em entrevista ao Jornal do Commercio, sugeriu que a superintendente da ZFM (Zona Franca de Manaus), Flávia Grosso, “desça dos seus saltos altos” e compareça, pessoalmente, à tribuna da ALE (Assembleia Legislativa do Estado do Amazonas) que “ela trata com tanto desprezo”, para discutir com os deputados da Casa, problemas como o aumento da pobreza em Manaus, onde só o PIM (Polo Industrial de Manaus) deve faturar mais de US$ 30 bilhões, este ano. Além de criticar essa grande e maciça concentração de renda nas mãos de um pequeno número de pessoas ricas, que manipulam e desta forma impedem que as riquezas sejam distribuídas com o grosso da população local. A parlamentar amazonense também responsabiliza e acusa os prefeitos municipais, além de outras autoridades e órgãos estaduais, pela situação de atraso e estagnação no processo de desenvolvimento social e econômico em quase todos os municípios. Enquanto aqui, acusa ela, as estatísticas registram que Manaus teve um crescimento de 92 %, contra um irrisório e quase insignificante percentual de 8% para o interior do Estado. Na condição de delegada da Polícia Civil do Estado, com mais de 20 anos de atividades e experiência, e de ex-corregedora geral de polícia no AM, com passagem ainda por várias delegacias locais de polícia, ela também afirma que a Secretaria de Segurança Pública do Amazonas nunca esteve tão bem aparelhada de infraestrutura e dotada de toda a logística necessária para funcionar e operar perfeitamente bem, até com helicóptero próprio. Contraditoriamente, porém, os índices de criminalidade e violência sobem a números que ela considera “estarrecedores”, em todo o Estado do Amazonas, onde, segundo destacou, o tráfico e o consumo de drogas já se tornaram uma verdadeira “praga”, com a tolerância e até a “banalização” desse crime, tanto em Manaus como em praticamente todos os nossos Municípios. A deputada atribuiu esse aumento da criminalidade à falta de um secretário competente e capacitado, que conheça com profundidade toda a problemática do setor da nossa segurança pública, principalmente em Manaus, e criticou o fato de que só autoridades da Polícia Federal sejam nomeadas para exercer esse cargo, aqui no Amazonas. Ela também fez referência à denúncia do deputado estadual Davi Almeida, que segunda-feira passada ocupou a tribuna, no plenário da ALE, para dizer que estava sendo ameaçado de morte, por alguém que telefonou para seu gabinete para fazer chantagem e extorqui-lo cobrando dinheiro. Leia detalhes, abaixo:
Jornal do Comércio – Na sua avaliação, a criminalidade deve ser tratada como prioridade aqui em Manaus e no interior do Estado?
Vera Lúcia – Eu quero deixar patenteado, desde logo, que eu sou uma mulher, mas que me considero representante tanto das mulheres como dos homens e do povo, em geral, do Amazonas. Faço questão de dizer também que sou delegada de carreira da Polícia Civil, mas que não sou deputada de uma só bandeira, ou de um segmento, como a Polícia, e que tanto a segurança como muitos outros setores públicos precisam ser tratados como prioridades e com a máxima urgência, aqui em Manaus e em todo o Estado. Na minha avaliação, as estatísticas que estão sendo divulgadas sobre números e índices de crimes ainda não transmitem toda a verdade, pois até por experiência própria, eu sei que elas tendem a camuflar e a falsear (esconder) a realidade dos fatos. Uma grande parte delas caiu no buraco negro, mas só as estatísticas que estão sendo divulgadas já são estarrecedoras.

JC – E o que é que está faltando, para combater e resolver esse problema da criminalidade?
VL – O que está faltando, realmente, é uma política de segurança, com planejamento, mas por alguém que execute, fiscalize e enfrente o problema. Isso, porém, tem de ser feito por uma pessoa que realmente entenda de segurança, que conheça os problemas do Amazonas nesta área, pois a Secretaria de Segurança Pública nunca esteve tão bem de infraestrutura, de logística e de recursos, aqui no nosso Estado. Até helicóptero a Polícia daqui do Amazonas já tem. O que falta, portanto, são recursos humanos, como um secretário capacitado para enfrentar e resolver o problema. Não basta, portanto, ser da Polícia Federal, como já se tornou um costume e uma constante, aqui, indicar e nomear alguém para esse cargo. Ser da Polícia Federal não é pré-requisito para alguém também ser um secretário de segurança pública. Pré-requisito, repito, é conhecer os problemas da segurança tanto aqui em Manaus como em todo o interior do Estado. Eu não tenho nada contra a PF e, inclusive, nem conheço, pessoalmente, o atual e o secretário passado, mas continuo insistindo que para combater a criminalidade é preciso conhecer a nossa realidade e suas peculiaridades. Aqui, nós não temos os problemas de outras grandes capitais, como sequestro e outros crimes graves, por exemplo. A PF é uma polícia competente e específica para lidar com o crime de tráfico internacional e garantir a segurança nacional, e não para reprimir o ladrão de galinha, os ‘aviõezinhos’ e outros criminosos de pequena monta.

JC – A Srª. estabelece uma relação de causa e efeito entre o crime e o problema social da pobreza?
VL – Eu nunca quis fazer essa associação, até porque as minhas origens são as mais humildes possíveis. Não é porque uma pessoa é pobre que ela tem de roubar, mas eu reconheço que a falta de oportunidades tem muito a ver com o problema do crime. Eu gostaria de estar errada, mas confesso que cheguei a esta conclusão.

JC – Nós fizemos esta pergunta com base nas estatísticas, que indicam que a pobreza aumentou aqui em Manaus, junto com a criminalidade, portanto. Manaus está situada entre as quatro capitais com maior PIB no Brasil, e só o nosso Polo Industrial deve faturar mais de 30 bilhões de dólares, este ano. Como presidente da Comissão de Relações Comerciais da ZFM, na ALEAM, o que a senhora tem a dizer a respeito dessas estatísticas?
VL – Eu tenho conhecimento de tudo isso e quero lhe dizer que esse problema me incomoda muito. Para ser sincera, eu já tive até vontade de sair dessa comissão, tudo porque o diálogo com a superintendente da ZFM é muito difícil. Ela nunca compareceu a nenhuma audiência pública, aqui na ALE, limitando-se a enviar algum representante. Nós precisamos da presença dela aqui para discutir esses problemas que você acabou de mencionar, como essa questão da concentração de renda aqui em Manaus, onde tem pouca gente ganhando muito e muita gente ganhando pouco. A superintendente da ZFM precisa descer dos seus saltos altos e vir discutir esses problemas com os deputados aqui na ALE, que ela sempre tratou com tanto desprezo. Para resolver esse problema, da falta de uma distribuição mais justa da renda de Manaus com a população mais pobre e carente, é preciso que os nossos empresários invistam mais na qualificação da mão de obra dos nossos operários, principalmente no PIM, onde os melhores cargos e empregos são ocupados por gente de fora, de outros Estados da federação. Essas oportunidades deveriam ser oferecidas para o cidadão amazonense!

JC – Agora que a ZFM será expandida para todos os municípios da Região Metropolitana de Manaus, a Srª. não acha que essa medida pode gerar uma economia artificial e negar ou prejudicar o desenvolvimento das nossas potencialidades e vocações naturais?
VL – Nós só poderemos saber se isso vai melhorar ou piorar a realidade desses Municípios, se a gente debater e discutir os nossos problemas. Essa é uma questão que tem de ser estudada, debatida, discutindo, repito, mas priorizando sempre a vocação de cada um desses municípios que vão fazer parte da Região Metropolitana de Manaus. E essa discussão não está sendo feita. Mas, para começar, eu acho que a criação dessa Região Metropolitana já está gerando igualdade de oportunidades entre os próprios empresários de Manaus e desses municípios, além de que, com certeza, vai gerar empregos e renda para muitos trabalhadores, por causa das indústrias que vão surgir. Mas nós só chegaremos a essas conclusões, repito, com a discussão de todas essas questões!

JC – E sobre essa escalada do tráfico e uso de drogas no meio da população e da nossa juventude, principalmente, o que a Srª. tem a dizer?
VL – Isso virou uma praga! Antigamente, ou até recentemente, essa era uma questão localizada mais aqui em Manaus, em bairros como o Educandos, São Jorge, Compensa e alguns outros, mas agora esse problema se alastrou para todos os municípios, e até para comunidades pequenas, de uma forma que o tráfico e o consumo de drogas estão sendo tolerados e banalizados em todo o Estado do Amazonas.

JC – E a que causas ou motivos a Srª. atribui essa escalada vertiginosa do tráfico, consumo e uso de drogas, em todo o Estado do Amazonas?
VL – Na minha avaliação, esse problema se agravou depois da descriminalização do uso de drogas, no Brasil, pois a lei que tolera o uso de drogas também está tolerando o tráfico. Uma coisa está ligada à outra, de forma intrínseca, inseparável. Eu também tenho a impressão de que esse problema pode estar ligado a esse tratamento de tanta tolerância que o governo brasileiro vem dispensando no seu relacionamento com países como a Bolívia, de onde provêm os grandes carregamentos de drogas que têm sido apreendidos ultimamente, aqui no Brasil. O candidato Serra já denunciou esse tipo de tolerância por parte do governo brasileiro. A descriminalização do uso e do consumo das drogas se tornou tão grave no nosso país, que até as próprias autoridades policiais e judiciais estão divergindo na hora de tipificar o tráfico no Brasil, como se cada autoridade, pessoalmente, desse uma interpretação pessoal e diferente para o mesmo crime. É por causa disso que muitos traficantes, quando são flagrados, defendem-se alegando que não estão vendendo mas, sim, consumindo drogas, dependendo da quantidade, logicamente. A única forma de tentar resolver ou diminuir esse problema seria prendendo e processando tanto o traficante como o usuário de drogas, como se fazia antigamente. É por esse motivo também que tem muito delegado aqui no Amazonas se limitando, simplesmente, a registrar muitas infrações e crimes de tráfico de drogas no livro de BO (Boletim de Ocorrências das Delegacias de Polícia), ao invés de instaurar o competente inquérito policial e enviar o caso para a Justiça.

JC – As estatísticas também registram uma disparidade, ou uma desigualdade gritante, entre o crescimento econômico de 92% em Manaus e tão somente de 8% no interior do Estado do Amazonas. Como é que a Srª., como representante de todos os amazonenses, interpreta esse processo de tanta desigualdade econômica e social?
VL – É por esse e muitos outros motivos que eu não sou deputada de uma só bandeira. O Amazonas tem problemas demais, para que um político, assim como um deputado, se especialize ou se preocupe com uma única pauta de problemas e questões. Eu sou considerada o terror dos prefeitos, aqui na ALE. Eles me odeiam! Pois, eu não sou desses políticos que viajam para o interior para almoçar na casa de prefeito. Para ser franca, eu nem conheço ou não tenho relacionamento pessoal com os prefeitos dos nossos Municípios, e confesso, sinceramente, que não entendo o motivo ou a razão de tão pouco desenvolvimento no interior do Estado, quando todo mundo sabe que os Ministérios, em Brasília, mandam dinheiro à vontade para os Municípios amazonenses. Como a verba do PAC, por exemplo, mas quando alguém visita o interior do Estado, não vê nada, nem sequer produção de alimentos, enquanto Manaus está comprando farinha de fora, de outros Estados. O próprio BASA, o Ministério da Agricultura e outros órgãos têm divulgado notícias e estatísticas comprovando que existe dinheiro à vontade para ajudar os municípios, mas é preciso que os prefeitos apresentem projetos, para receberem essa verba. O problema é que os prefeitos não se incomodam. Outra questão que eu observo é a prestação de contas dos prefeitos, no Tribunal de Contas do Estado. Parece até que eles têm uma cartilha própria para burlar a prestação de contas nos tribunais, ministérios e outros órgãos para os quais essas prestações de contas são enviadas. Nessas prestações de contas, muitos prefeitos fazem constar que muitas obras foram construídas e acabadas, quando, na verdade, não tem nada feito. É por isso também que eu defendo e sustento a ideia de que os conselheiros dos Tribunais de Contas dos Estados deveriam ser funcionários de carreiras, aprovados em concurso público, e não essa coisa de indicação, de nomeação ou essa coisa de política. Ou seja, esse problema da omissão e da corrupção é um problema que realmente está precisando de um enfrentamento. Para concluir, de uma forma concreta, finalizo que neste momento eu estou brigando para quebrar o monopólio da Trip que impede que as passagens aéreas barateiem nos aviões que fazem linha para Tabatinga, Benjamin Constant e outros Municípios distantes de Manaus. É um absurdo que uma passagem de avião para esses Municípios amazonenses esteja custando mais caro do que viajar para os Estados Unidos, Chile e Argentina, por exemplo. Eu já conversei com a superintendente da Anac, a respeito desse problema, e agora vou convocá-la para participar de uma audiência pública, aqui na Assembleia Legislativa.

Redação

Jornal mais tradicional do Estado do Amazonas, em atividade desde 1904 de forma contínua.
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