“Ele descobriu ainda outro embaraço ainda mais crucial: ao poder público não importava resolver essa restrição portuária. Portanto, era fácil compreender porque o Polo Industrial de Manaus estaria condenado a recorrer permanentemente às alternativas existentes.”
Por Alfredo Lopes(*) Coluna follow-up
Na mesma época em que foi lançada a pedra fundamental do CBA, Centro de Biotecnologia da Amazônia, 1998, a Suframa, Superintendência da Zona Franca de Manaus, resolveu pautar a construção do EIZOF, o Entreposto da Zona Franca de Manaus, uma estrutura que atendesse as demandas crescentes de logística dos transportes do Polo Industrial de Manaus. O Porto Público, construído pelos ingleses no início do século XX, foi transformado numa guerrilha urbana de caráter político, política pequena, é bem verdade, que resultou no chamado quiproquó de fabricacao do caos. A ideia de construir outro Porto público, destinado à dinamização da economia da ZFM, que alcançava padrões chineses de crescimento, em vez de agregar, agravou a desunião. Ele seria construído no Porto da Siderama, um projeto de siderurgia para atender a indústria que não deu certo. Com um faturamento anual em torno de US$ 32 bi, a Suframa sempre desconfiou que projeto dessa envergadura é sinônimo das desavenças locais. Siderama, Eizof, Porto das Lajes…
Foi então que por aqui desembarcou José Geraldo Vantine, chamado pelos atores federais da indústria que teimavam em demonstrar que não vieram para Manaus a fim de remover a ZFM, como diziam os boatos na virada do século. Especialista em logística de transportes, fundador e CEO da Vantine Logistics & Supply Chain Consulting, empresa de Consultoria em Logística e Supply Chain Management, desde 1986. Formado em Engenharia Industrial, com formação complementar em Logística pela The Ohio State University, e diversos cursos de atualização na França, Inglaterra, Itália, Espanha, Canadá e Japão, Vantine é um consultor de múltiplas interações. Ele começou na General Motors do Brasil, onde, em pouco tempo, se tornou Superintendente no setor de Movimentação e Armazenagem, nome dado à Logística Industrial à época. Desde então, coleciona mais de 800 projetos em todos os segmentos da logística portuária. Tudo que Manaus precisava para enfrentar um gargalo que os ingleses haviam resolvido em dois tempos um século atrás. A convite dos países e de grandes empresas, desatou os nós representados pelos imbróglios logísticos com soluções decisivas.
Ao chegar na Amazônia, no final dos anos 80, logo percebeu que, ao lado da riqueza natural e da indústria, já estava instalada toda a cadeia de valor das empresas de serviços logísticos: portos fluviais de navegação marítima, portos fluviais de navegação interior (balsas, empurradores), portos de navegação comercial e de passageiros, companhias de transporte fluvial, operadores logísticos etc.,etc… Apesar disso, o duopólio portuário de Manaus impedia que a competição, cláusula pétrea do capitalismo, e colocava as empresas sem outras saídas que não fossem as disponíveis no lugar. Vantine descobriu ainda outro embaraço ainda mais crucial: ao poder público não importava resolver essa restrição portuária. Portanto, era fácil compreender porque o Polo Industrial de Manaus estaria condenado a recorrer permanentemente às alternativas existentes.
Apesar dessa alentada bagagem, e com uma lista de projetos específicos para modernizar e racionalizar custos do polo industrial de Manaus, e incrementar a competitividade da indústria, restou a Vantine, referência prestigiada em Logística no Brasil, prestar robusta colaboração ao Ministério dos Transportes. Para não perder a viagem, ele topou adensar a criação do PNLT – Plano Nacional de Logística e Transportes, e do PNLP e Plano Nacional de Logística Portuária. Foram estruturas que integraram um ministério importante que, ano após ano, entretanto, olhavam para as demandas da ZFM da mesma maneira que o GT-PPB sempre olhou para os projetos industriais que deveriam ser aprovados pela burocracia federal. Um grupo engravatado e formado pelo MDIC e MCTI, que foi organizado para licenciar (ou embargar?) os itens que poderiam ou não ser fabricados em Manaus.
Além de atender demandas pontuais de muitas empresas de Manaus, Vantine organizou estudos técnicos e acadêmicos com as entidades da indústria para priorizar a alternativa da cabotagem como o modal mais coerente, sustentável e ajustado às demandas logísticas do Polo Industrial de Manaus. Ora, para um um país que dispõe de 8000 km de costas litorâneas e 20.000 km de vias navegáveis na Amazônia, a cabotagem é uma obviedade gritante. Essa recomendação estava descrita em detalhes no PNLT, um roteiro precioso com as premissas e necessidades do modal e seus ganhos de competitividade. Não custa perguntar a razão pela qual esta modalidade logística não foi adotada e implantada 5 décadas depois de sua comprovada necessidade pelo governo federal, responsável pelas atribuições e provimento de infraestrutura. A resposta será facilmente encontrada por nós, por nossa adesão habitual e antiga à omissão crônica da brasilidade com a Amazônia, seus potenciais e respectivas exigências de aproveitamento. Concluo essa reflexão transcrevendo alguns projetos de José Geraldo Vantine, na expectativa de que a tribo olhe para si mesma e se ponha a ensaiar o ritual nativista da coreografia de amor ao Amazonas.
- SAIDA PARA O CARIBE – Ligação rodoviária pela BR-174 ligando Manaus a Boa Vista (RR), acessando de um lado a Venezuela (Puerto Cabello) e de outro a Guiana através e Georgetown. Foi muito utilizada até mesmo para ligar Manaus com a Colômbia e a pioneira foi a “Rodoviário Michelon”.
- LIGAÇÃO BIO-OCEÂNICA – “Atlântico – Pacífico” utilizando o rio Solimões (Marañon) de Manaus até Iquitos (Peru) e via rodoviária até Piura (norte) ou Ilo (sul). Se apresentou como totalmente inviável pelo elevado investimento e baixa demanda bilateral;
- Criação de modelo chamado de “CENTRAL DE TRÂNSITO” que ao ser transformado em lei estadual passou a ser EIZOF – Entreposto Internacional da Zona Franca. Inicialmente funcionou dentro do Porto Público, mas depois da inauguração do EADI – Porto Seco Manaus, perdeu sua finalidade inicial;
- EIZOF-SIDERAMA – Siderama foi uma Siderúrgica(desativada).Participei de uma consórcio em projeto executivo para lá instalar o EIZOF e transformou o local numa super estrutura de Logística e Comércio Internacional, com localização privilegiada ao lado da BR-319 (próximo ao local conhecido por Ceasa)e na margem do Rio Negro. Com mudanças de governos (SUFRAMA), o projeto foi engavetado;
- LOGÍSTICA INTEGRADA PIM – Envolvendo mais de 200 indústrias do Polo, foi fundamental no princípio, para a sinergia nas operações de Transportes desde as fábricas até o destino (NE e SE) incluindo a gestão por Operador Logístico na contração de balsas, carretas, terminais fluviais em Manaus e Belém. Foi desenvolvido para o CIEAM / SUFRAMA, e continua aplicável na integra até hoje.
- CORREDOR DE CONTEINER MACAPÁ – SANTANA / MANAUS – foi concebido para ser uma alternativa para evitar o transit time de navios de longo curso até o porto de Manaus. Sendo um porto de transhipment em Santana/AP, os contêineres seriam transferidos dos navios conteneiros para balsas em comboio até Manaus. Por ser projeto estruturante não foi incluindo nos Planos dos Governos Federais que se sucederam;
- PROJETO CLAD – COMPLEXO LOGÍSTICO AMAZONAS / FLÓRIA-USA, com instalação de Armazém Alfandegado dentro do Porto Everglades (Condado de Broward/FL) incluiu instalação de linha de navegação direta de Manaus e Companhias Aéreas operando entre Manaus e Fort Lauderdale/FL. Entregue para inciativa privada;
- PNLT – AMAZONAS – foi o primeiro Plano de Logística e Transportes desenvolvidos pelo Ministério dos Transportes. Atuamos no desenvolvimento de propostas para o estado do Amazona e a ZFM. Composto por: Polo Irradiador de Manaus (bidirecional), Eixo Leste via Santarém (BR-163), Eixo Oeste via Porto Velho (BR-319 / BR-364) e Eixo Norte via BR-174 até Boa Vista acessando a Venezuela na divisa com município de Santa Elena).