Nesses tempos de calor intenso, muita fumaça e aumento exponencial de notícias desanimadoras sobre eventos climáticos extremos, não é só o clima que está mudando. A gente não percebe, mas nossa mente também se transforma.
Por vezes, evita-se de dar uma corrida na orla da Ponta Negra por conta fumaça, ou de ir em uma cachoeira em Presidente Figueiredo por causa da insolação, e parece que “está tudo bem”. Mas, de acordo com um editorial publicado na revista científica Nature, de abril de 2024, nosso cérebro interpreta isso como “sinais de atenção” que “não temos muito o que fazer”. E isso está nos deixando doentes – que até já tem nome: ecoansiedade.
Em 2022, a Organização Mundial da Saúde (OMS) incluiu a ecoansiedade na lista de doenças mentais, ativador e intensificador de ansiedade generalizada, estresse emocional, depressão e comportamento suicida.
Portanto, essa enxurrada de notícias ruins, a inércia dos tomadores de decisão e nossa sensação de impotência têm aumentado significativamente os casos de doenças mentais – principalmente entre os jovens.
O aumento na busca por ajuda psicológica e psiquiátrica, por conta das mudanças do clima, fez com que os especialistas cunhassem outra palavra: solastalgia.
A solastalgia, da tradução livre do Inglês, é a angústia causada pela “perda de casa, ainda morando nela”. É o desconforto pelo sentimento de perda e impotência quando o nosso lugar no mundo é violado ou gravemente modificado. Isto não se refere somente ao local físico, mas também ao modo de vida.
Este contexto faz com que os impactos das mudanças do clima ultrapassem a concretude do aumento dos níveis do mar, a seca na Amazônia, as queimadas no Pantanal e as ondas de calor na Europa Central. Isto tem provocado uma geração inteira de pessoas ecoansiosas e infelizes, que acreditam piamente que os desafios das mudanças do clima não serão vencidos.
E, infelizmente, isso tem agravado a situação dos suicídios e automutilações. Um estudo conduzido pela Fiocruz, e publicado este ano na renomada revista The Lancet Regional Health Americas, apresentou que o mundo teve redução média nos casos de suicídios em 36%, no período de 2011 a 2022, enquanto no Brasil houve um aumento de 43% no mesmo período! E a taxa de suicídios entre as pessoas indígenas é muito maior que a média brasileira.
Apesar de existir essa relação causal, ainda não se sabe como se dá a contribuição direta das mudanças do clima ao aumento significativo dos suicídios no Brasil – muito por conta dos impactos, também negativos, da pandemia do Covid-19.
Portanto, é essencial que o Brasil tenha políticas públicas de assistência social e acompanhamento de saúde de casos de suicídios e automutilação para entender o impacto real das mudanças do clima em públicos específicos e vulnerabilizados. A partir disto, formar e oferecer profissionais da saúde mental especializados em questões específicas e sensíveis – como o suicídio de pessoas indígenas.
É preciso reconhecer que estamos destruindo a natureza do planeta e a natureza humana, mas somente uma delas se regenerará daqui algumas centenas de anos.
As mudanças do clima provocam a humanidade em direção a uma reflexão profunda sobre aspectos externos à saúde mental: meios de consumo, distribuição de renda, modos de vida e proteção da vida na Terra – de todas as vidas!
O que não podemos negligenciar são as mudanças internas também necessárias: cumplicidade, cuidado e autocuidado, empatia, altruísmo, e bem-viver.
Neste Setembro Amarelo, que nós possamos combater o preconceito contra os problemas da saúde mental, e o negacionismo climático, para ajudar a humanidade a vencer esses períodos de transformação e regeneração.