Nas atuais circunstâncias que envolvem paralelamente as relações entre o homem, a sociedade, o Estado, os direitos e os deveres, a cidadania não pode e tão pouco deve ser tratada como simples modismo ou como mero adereço material ausente da natureza humana. Ou seja, a cidadania não constitui um acessório que poderá ou não ser adotado pelo homem em sua relação com o meio.
A humanidade, desde os seus primórdios, edificou a cultura humana baseada no conjunto de hábitos e costumes escolhidos e organizados pela própria humanidade, que se viu marcada pela vontade aparentemente deliberada dos detentores do poder em manter o cidadão alheio e indiferente em relação à sua realidade social.
Desde a sua formação, a tradição mostra um Estado que se legitima pelo autoritarismo e cuja consequência mais imediata é a ausência de participação popular na construção do espaço público.
Em realidade histórica, a cultura brasileira gerou enorme alheamento do cidadão em relação ao conteúdo efetivo de sua existência, seus direitos reais, suas necessidades e potencialidades de ser feliz.
A crise do Estado não está assentada somente na sua fragilidade para dar respostas materiais às demandas de parcelas importantes da sociedade. Assenta-se também no aprofundamento de sua falta de transparência e impermeabilidade para lidar com uma realidade social que se estilhaça e produz novos movimentos, novas identidades e buscam permanentemente criar alternativas para superação, baseada na consciência de suas potencialidades e na implementação de ações voltadas para a realização humana.
A desestruturação do modo de vida moderno tem, na destruição do modo fabril tradicional e da estrutura de classes, o seu exemplo mais paradigmático nessa relação diária com as circunstâncias que o cercam.
O homem, porém, não é um ser isolado, e sua realização também não pode ser obtida senão em função do conjunto de circunstâncias que interfere em sua vida, como a natureza, o Estado, os demais seres humanos, as organizações e tudo como que os homens convivem.
Um novo cenário na relação entre a sociedade e o Estado, a partir da década de 90, surgiu com os mecanismos de participação e de fiscalização da gestão pública. A Constituição de 1988 revelou-se como um instrumento capaz de projetar um grande avanço nas relações entre a sociedade civil e as gestões da administração pública, numa clara alusão de que o Estado tem que ser mudado, mas devemos saber que ele não muda sozinho. É preciso uma ação coletiva para conquistarmos o Estado que queremos, o cidadão que podemos ser.
Essa conquista só será atingida quando formos capazes de exercer plenamente nosso papel de cidadão, agindo com consciência no cumprimento de nossos deveres e na defesa de nossos direitos, votando com convicção nos melhores, dispondo-nos a assumir responsabilidades adequadas à nossa competência, acompanhando, avaliando e exigindo maior eficiência do Estado.
O cruzar de braços de muitos deixa expostos quem se posiciona, e isso é péssimo. Aliado a isso, os detentores do poder nas três esferas detestam cobranças, pois só adoram os aduladores de plantão e os fanáticos seguidores. Havendo postura correta dos cidadãos, as consequências vêm depois, com escolas, hospitais, estradas, enfim, com os benefícios que toda a coletividade deseja.