11 de dezembro de 2024

Processo de reajustes

Daniel Nascimento-e-Silva, PhD

Professor e Pesquisador do Instituto Federal do Amazonas (IFAM)

A ideia de reajustes prevista no método científico-tecnológico está vinculada à compreensão de validade e fidedignidade. Aliás, não se deve nunca deixar de lembrar, todo os processos de ajustes e reajustes estão voltados para a garantia de que o protótipo consiga cumprir a sua finalidade, a sua razão de existência, que é chamada de validade. Mas não basta que que a validade seja garantira. É necessário que os benefícios prometidos funcionem sempre do mesmo jeito, da mesma forma, que é o que se chama de fidedignidade. Daí se compreende que se um protótipo prometeu cinco benefícios, terá que ser aprovado na validade desses benefícios prometidos para que galgue a posição de produto finalizado ou simplesmente tecnologia pronta. Se, por exemplo, um protótipo pretende aumentar a aprendizagem matemática e reduzir o tempo de aprendizagem para pessoas com limitações cognitivas, a garantia de que esses benefícios sejam efetivamente entregues é feita através dos respectivos testes de validade. Os testes de fidedignidade, por outro lado, se preocupam em assegurar que as medidas que a tecnologia apresentar são confiáveis, o que significa que aquele resultado é realmente o que a pessoa aprendeu naquele exato tempo medido. Vejamos o que os ajustes têm a ver com isso para que se possa compreender a função dos reajustes nesse esforço de produção tecnológica.

Os ajustes, geralmente, vão fazer os devidos reparos obrigatórios os indicadores de desempenho que fracassaram durante os testes de validade. Por exemplo, as cores em jogos infantis cumprem vários papéis muito importantes, como prender a atenção. Em uma tecnologia voltada para públicos com dificuldades de atenção, a calibração da cor é fundamental para que haja a validade do protótipo como “prendedor de atenção”. Faz-se, portanto, o teste de “prisão de atenção”, para aferir a validade. Se o resultado não for o esperado, é preciso fazer ajustes na cor até que ela consiga prender a atenção e, assim, poder ser aprovada nesse quesito de validade. O mesmo procedimento vale também para reprovações relativas à adequação das peças e componentes que influenciam inadequadamente na garantia de que a tecnologia vai cumprir o seu papel. Essa é a primeira preocupação de prototipagem. A segunda geralmente só começa quando a garantia de validade é alcançada. É aí que entra a ideia de reajustes.

Os reajustes têm dois sentidos. O primeiro é relativo à necessidade de se refazerem as alterações no protótipo toda vez que uma reprovação é detectada durante os testes de validade. Reajustam-se, portanto, as peças e componentes para que o conjunto possa gerar os resultados desejados. O segundo é relativo à confiança de que aqueles resultados alcançados vão se comportar de uma forma predeterminada. Isso quer dizer que, garantido o funcionamento adequado do protótipo para gerar os benefícios pretendidos, os reajustes vão gerar a garantia de que aqueles benefícios vão ser obtidos sempre da mesma forma. É por essa razão que os reajustes respondem por uma forma de sintonia fina do protótipo, ajustando e reajustando o seu funcionamento de uma forma tal que não mude substancialmente com o passar do tempo. Vejamos alguns exemplos.

Certa equipe de cientistas estava trabalhando nos reajustes da captação de ondas infravermelhas por parte de um protótipo. Para isso, primeiro fizeram os testes para terem a garantia de que o aparelho captava ondas infravermelhas e não raios-x, por exemplo. Notaram, a partir do primeiro teste, que a tecnologia mesclava a captação dessas duas ondas, alternadamente. Fizeram os ajustes e conseguiram obter o resultado desejado: captação de ondas infravermelhas. Isso quer dizer que o aparelho era válido para essa missão. Em seguida perceberam que as ondas captadas em cada teste apresentavam grandes disparidades. Em um segundo mudavam de intensamente altas para quase inexistentes. Fizeram os ajustes nas peças do captador e conseguiram melhorar a captação, mas ainda havia disparidades indesejáveis. Daí fizeram vários reajustes apenas na forma de calibração da programação, obtendo-se os resultados esperados.

Outra equipe de pesquisadores pretendia criar um sistema de avaliação da qualidade da água de um riacho a partir de monitoramento remoto. O sistema consistia em um dispositivo que media a acidez da água. Esse medidor disparava as informações via satélite para uma central, que comparava os resultados em tempo real com um padrão eletrônico, usando aprendizado de máquina. Nos primeiros testes foram necessários vários ajustes porque o dispositivo não estava conseguindo medir a acidez da água. Nas primeiras medidas vinham apenas as quantidades de sódio presentes. Fizeram ajustes no dispositivo medidor até que conseguiram que fosse medida a acidez. As primeiras medidas apresentaram disparidades dos níveis de acidez segundo a segundo, como se a água em um segundo estivesse excessivamente ácida e no segundo seguinte estivesse alcalina, por exemplo. Fizeram muitos reajustes para que fosse calibrada a forma exata de mensuração da acidez. Levaram alguns dias, ora mexendo fisicamente no dispositivo, ora na forma como a programação trabalhava os dados coletados. Depois de dois meses, os cientistas conseguiram fazer com que o monitoramento daquele curso de água funcionasse a contento, como planejado e acertado com os seus clientes.

Os reajustes, portanto, são esforço de pesquisadores para garantir, principalmente, a confiança na tecnologia que vão entregar aos seus clientes e usuários. E isso, tenha-se a certeza, não é tarefa fácil. Muitas vezes é quase que impossível. Tanto é assim que são as necessidades de reajustes que explicam, por exemplo, a existência de quase todos os serviços de pós-venda, incluindo aí as tão conhecidas revisões obrigatórias. A maioria delas é decorrente do fato de que certas peças e componentes do produto se desgastam com o tempo e com o uso e precisam ser trocadas ou aferido o seu funcionamento. Esse tempo é o que chamamos muitas vezes de tempo de garantia. Para que ele serve? Exatamente! Para garantir que o produto acabado vai funcionar bem até aquele tempo. Depois daquele tempo é necessário que haja ajustes (como as trocas de peças) ou reajustes (como a calibração do óleo de câmbio) de outras.

Daniel Nascimento

É Professor e Pesquisador do Instituto Federal do Amazonas (IFAM)

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