11 de dezembro de 2024

O servidor como alvo

Pensei que após a pandemia os servidores públicos seriam tratados com honestidade e respeito após tantos serviços prestados, inclusive arriscando a própria vida e a dos seus familiares dado o alto poder de contaminação. Estava enganado. Mesmo com milhares de mortos, setores poderosos da economia, aí incluídos os seus representantes na mídia e na política, voltam suas armas contra esses trabalhadores.

A pressão do privado contra o público é desleal, até porque os seus tentáculos atingem até mesmo alguns representantes classistas, cruzadores de braços ou até mesmo pelegos, que deixam a coisa correr, sem nada articular, sem reagir. Pior é ver servidor público concordando com certas coisas.

O servidor que sequer fala para os seus familiares e amigos sobre a sua importância para a sociedade e o papel que ele exerce em prol da coletividade está sendo conivente com os ataques e contribuindo para a desvalorização e enfraquecimento dos serviços públicos.

Não vale esperar que o reconhecimento ocorra naturalmente, até porque parcela da sociedade acaba ouvindo uma parte, sem ouvir o contraponto, muito comum num país que acaba invertendo valores em algumas situações. Nas reportagens ou entrevistas geralmente só encontramos profissionais e representantes do lado privado, sem nenhum representante dos servidores.

O desespero é tão grande pra falar mal do setor público que tem emissora de televisão que possui até repórter escalado(a) pra mostrar em comentários ou em reportagens tendenciosas o quanto o serviço público é um fardo para a nação, e o quanto o setor privado é produtivo.

Tirando os cargos comissionados e os indicados pelos agentes políticos a cada mandato, os que entraram por mérito via concursos lidaram com exaustivos estudos e certamente venceriam no campo privado, mas escolheram o setor público. Anos depois se deparam com a perseguição, com o discurso de que trabalham pouco e ganham muito, com a destruição da reputação.

Claro que, ainda na pandemia, muitos esquecem rapidamente que para salvar vida em hospital particular o custo estava orçado em cerca de R$ 100 mil. As escolas particulares baixaram os preços, deram desconto? Que eu saiba, acenaram com um desconto para ser pago na sua totalidade após a pandemia. Isso sem contar com os aumentos abusivos nos preços em vários setores no pior momento.

Creio que até seria bom concordar com a privatização de tudo. Aí as pessoas veriam o quanto custa abrir mão dos serviços públicos. Claro que os mais necessitados seriam os mais afetados, o que aumenta mais a responsabilidade dos servidores na busca da excelência na hora do atendimento.

Quando vejo alguém falar sobre alguma categoria que é bem remunerada, percebo que é enganoso não pensar nas mordomias e gordos salários do setor privado. Só fazem comparações com os baixos salários da maioria massacrada do setor privado sem incluir os executivos.

Ninguém fala das “peixadas” e dos espaços dados a aliados políticos nos conselhos das estatais e empresas públicas para pagamentos de jetons, onde num drible às regras do abate-teto os adicionais chegam a R$ 40 mil e, somados aos salários, permitem vencimentos superiores ao limite salarial da administração pública.

É irritante ver pessoas que sequer conhecem o serviço público por dentro dando palpites. Falam tanto em justiça social, mas esquecem do sofrimento dos trabalhadores. Exigem qualidade dos serviços públicos, mas não querem remunerar bem os que ali trabalham. Almejam uma boa educação, mas querem pagar dois salários mínimos para o professor. Atacam tanto, mas esquecem de questionar os juros da Dívida Pública e os ganhos e as mordomias dos políticos.

*Auditor fiscal e professor.

Augusto Bernardo

é auditor fiscal de tributos estaduais da Secretaria de Estado da Fazenda do Amazonas e educador. Foi um dos fundadores do Programa Nacional de Educação Tributária (atualmente nomeado de Educação Fiscal).

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