Da proclamação da República à eleição de Jair Bolsonaro, o Exército brasileiro tem sido um ator institucional decisivo na experiência política brasileira.
Tal experiência histórica mostrou que, nos mais variados eventos, que o protagonismo das FFAA foi decisivo para um desfecho legalista ou autoritário do jogo político cívico-militar.
Embalada pela Constituição de 1988, a Nova República não foi revanchista com os militares que governaram autoritariamente o País por 21 anos.
Em seu sentido amplo, o marco constitucional de 88 endossou amplo escopo de direitos e deveres para os militares, agora em estreito contato e submetidos à autoridade civil, colocando-os em uma posição privilegiada na direção do País.
Os militares são responsáveis pelos projetos estratégicos no âmbito da Defesa Nacional. O papel das FFAA é pensar e agir, se necessário, quando ameaças estrangeiras ou deterioração civil-social se manifestam, o que significa dizer que num estado de anomia e em nome da segurança da República, dos cidadãos e da ordem constitucional vigente é perfeitamente cabível o emprego da força para a garantia da lei e da ordem.
Em outras palavras, os militares são fundamentais para a ordem pública do País, porém politicamente constrangidos pelos mesmos mecanismos constitucionais.
Embora constitucionalmente relevantes, os militares mantiveram-se distantes da vida política desde o fim do regime militar.
O retorno à caserna, por tanto tempo, se deveu certamente aos traumas causados pelo regime de 1964, pelos confrontos dos militares com grupos armados de guerrilha, pela repressão à liberdade de imprensa e pelo processo de anistia que sentenciou moralmente os principais agentes do regime.
A longa experiência social-democrata, que contou com a eleição de FHC e terminou com o impeachment de Dilma Rousseff, pôs em prática um projeto de esvaziamento das FFAA do debate político nacional.
Militares não só deixaram de assumiam funções políticas na alta administração do Estado (algo muito comum no universo das democracias, como nos casos de EUA, Israel e França) como também tiveram o Ministério da Defesa, uma pasta altamente especializada, sob constante controle de civis.
O projeto social-democrata estabeleceu, portanto, uma relação de distanciamento político, com claras linhas divisórias, prejudicando assim a possibilidade de um jogo de cooperação mútua entre civis e militares.
Durante todo esse tempo, as FFAA foram se profissionalizando e se fortalecendo como instituição: participação nas operações de paz da ONU e na retaguarda das polícias civis e militares; criação de escolas e institutos superiores de ciência e tecnologia; inovação bélica e de equipamentos militares; planejamento da defesa nacional entre tantas contribuições.
O projeto de isolamento, não reconhecimento e marginalização teve um custo alto. A aposta social-democrata foi equivocada e pouco educativa. Não entenderam que a convivência entre civis e militares é saudável e construtiva. E que a troca de experiências e responsabilidades pode ser amplamente benéfica para a vida democrática.
A velha toada isolacionista e marginalizante foram contraproducentes e alimentaram o ressentimento das alas mais politizadas das FFAA. A candidatura de Jair Bolsonaro e o clímax de radicalização ideológica iniciada em 2013 recolocaram, outra vez mais, os militares no olho do furação.
*Breno Rodrigo de Messias Leite é cientista político
Fonte: Breno Rodrigo