15 de setembro de 2024

Manaus: do tsunami viral à barbárie naturalizada

Por eu acreditar no poder da solidariedade social, que a união faz a força, que sozinhos somos fracos e que juntos somos fortes, é que eu terei muita satisfação em dizer-vos o que pensa a minha colega de profissão Víllian da Costa Herculano, professora de Filosofia da Faculdade Salesiana Dom Bosco (FSDB), Psicopedagoga, Mestra em Ensino de Ciências pela Universidade do Estado do Amazonas (UEA) e o filósofo Ângelo Assis da Rocha, Bacharel em Filosofia pela FSDB e Graduando em Teologia pelo Instituto de Teologia Pastoral e Ensino Superior da Amazônia (ITEPES) sobre o aumento dos casos de Covid-19 e a falta de oxigênio em Manaus. 

Naturalmente, nesse tempo de pandemia, a nossa conversa foi por WhatsApp. Eles me escrevem dizendo, como segue o texto de ambos na íntegra: “Após constatar a redução de casos da COVID-19, a Prefeitura de Manaus anunciou o fechamento do Hospital de Campanha, pouco mais de dois meses de funcionamento. Na ocasião, o prefeito da capital do Amazonas, Arthur Neto, chegou a afirmar que “isso foi um teste para nós todos, o fato é que saímos mais fortes”. A fragilidade das nossas atitudes mostraram que a comemoração foi equivocada. O banquete da imediatez impulsionou os instintos do “homo sapiens”. A cada esquina, uma máscara jogada no chão e as garrafas de álcool sobrando nas prateleiras do capitalismo. 

O hospital de campanha instalado no CIME (Centro Integrado Municipal de Educação), localizado no Lago Azul, Zona Norte de Manaus, teve sua passagem relâmpago, porém o vírus circulava em parceria com o descaso da população, naturalizando as perdas e o sofrimento das famílias em luto. O otimismo apressado e o ingênuo iludiam uma crença superficial diante do mal. A lógica do pior estava por vir. O otimismo trágico também esteve presente no Boletim do Projeto Atlas ODS Amazonas, do Centro de Ciências Ambientais da Universidade Federal do Amazonas (UFAM), pois afirmara naquele momento que “Manaus poderia ser a primeira cidade a vencer a covid-19 “. 

O governador do Amazonas apresenta o plano de reabertura gradual do comércio, promovendo a retomada da economia, sem campanhas educativas nem preventivas para a sociedade. O Estado dá uma guinada na economia, retomada que traz consigo não só o entusiasmo com as núpcias do Capital, mas uma gigantesca onda roxa de contágio na população. Um tsunami sacudiu as estruturas, arrastou muitas famílias para os cemitérios, devastou com perdas e danos, os pilares que sustentam a arrogância humana. A retomada da economia é necessária? Naturalmente que sim. Com planejamento estratégico de gestão pública preocupada não só com a economia, mas também com a vida dos pobres mortais. 

Recentemente, circulou nas redes sociais um vídeo de um profissional da saúde responsável pelos socorros nas ambulâncias do SAMU, suplicando aos cidadãos que tivessem consciência do perigo, que evitassem aglomerações e usassem máscaras. O trabalho desses guerreiros da saúde pública triplicou, estão no limite da exaustão humana. Salvando vidas diariamente, porém injustiçados com salários defasados e falta de estrutura e condições dignas no exercício das suas funções. São guerreiros e guerreiras que merecem de nós, no mínimo, um ato simbólico de reconhecimento ético e humanístico; atitude que deveria ser objetivada com o nosso bom senso, seguindo rigorosamente as precauções necessárias para nos manter vivos nesse planeta de pessoas apressadas para morrer.

Sem a contribuição da população (do homo “sapiens”), eles não suportarão tamanha pressão. É desumano demais. Preocupa-nos assistir ao espetáculo da ignorância humana. A ausência do senso de responsabilidade, de solidariedade e compaixão uns com os outros é assustadora. Zero de Alteridade, zero de respeito com a vida do outro. O eu centrado no epicentro de uma pandemia a desfilar pelas ruas sem medo, com o peito inflado de uma coragem negacionista da vida, a debochar daqueles que se cuidam. Parece um ritual fúnebre de intolerância, má fé e perversidade”. 

Por fim, e não menos importante, posso concluir nesse diálogo entre esses dois amigos filósofos que os professores de Manaus têm muito o que contribuir com a cidade, esclarecendo os estudantes e a comunidade em geral sobre a corrupção, a falta de empatia, de amor, respeito e solidariedade que reinam, principalmente, entre os nossos políticos e governantes. Por isso que Manaus tornou-se, nesse início de ano, um tsunami viral e uma barbárie naturalizada. Ou seria uma tragédia anunciada? Pense nisso!

Luís Lemos

É filósofo, professor universitário e escritor, autor, entre outras obras, de "Filhos da Quarentena: A esperança de viver novamente", Editora Viseu, 2021.

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