No debate sobre como lidar com a pandemia, parece faltar o caminho do meio quando se discute trancar a cidade ou liberar tudo. Nessa época, a emoção pode nos atingir de diversas formas, seja pela perda de entes queridos e/ou amigos, seja pelo sentimento pessoal de se ter contraído o vírus chinês ou seja pelo sentimento negativo gerado por conta da contagem diária de mortes e superlotação dos leitos de atendimento da rede hospitalar. No entanto, diferente de nós, os nossos governantes não podem estar sujeitos a esse tipo de emoção para tomar decisões. A tomada de decisão que influencia em milhões de vidas no nosso estado não pode ser tomada baseada em emoções, mas sim no que, de fato, vai ajudar a melhorar a combater essa pandemia no curto, no médio e no longo prazo.
Nunca antes nas histórias de pandemias, conforme livros e estudos sobre pandemias relatam, houve a opção por um lockdown geral, ou seja, um trancamento das pessoas sadias junto com os doentes e as pessoas dos grupos de risco. O processo de isolamento sempre se deu por meio do isolamento do grupo de risco e das pessoas já doentes, separando-as das pessoas sadias. Por isso, países que utilizaram a ampla testagem puderam, nessa pandemia, se organizar e se defender melhor do vírus chinês, isolando os contaminados e mantendo a atividade econômica em funcionamento. Além disso, políticos aproveitaram esse momento para fazer algo que poderia ser considerado inacreditável: roubar dinheiro da saúde.
Pode ser coincidência, mas os dois estados mais envolvidos em escândalos de corrupção na pandemia são os dois estados com o pior desempenho na pandemia na contagem de mortes por milhão: Amazonas (o pior do Brasil) e Rio de Janeiro (o segundo pior) – conforme a tabela abaixo demonstra o ranking dos nossos 27 estados .
No Rio de Janeiro o governador encontra-se afastado e está sendo investigado. Aqui no Amazonas os nossos deputados estaduais, que deveriam ser os guardiões de eventuais desmandos no executivo estadual, não afastaram o atual governador. Aqui, a investigação segue em andamento, tendo resultado inclusive em prisões de secretários de estado.
Agora, temos nesses primeiros meses de 2021 a péssima experiência do trancamento geral, de pessoas sendo paradas na rua, da restrição do direito de ir e vir. Para alguns, a situação parece surreal. Algumas pessoas argumentam que essa restrição é necessária, porque vai reduzir a transmissão do vírus e com isso desafogar a rede hospitalar. Essa tem sido a motivação que tem justificado de certa maneira a lógica do trancamento: a famosa ‘redução da curva’. Muitos médicos, o ex-Ministro da Saúde Nelson Teich entre eles, são contra esse lockdown sem inteligência. O trancamento precisa ter um motivo, precisa ter método e precisa ter prazo. A Nova Zelândia, por exemplo, adotou uma estratégia de lockdown inteligente, dividido em fases, baseado em testes e com amplo preparo e expansão da rede hospitalar. O resultado foi que aquele país ficou 29 dias em lockdown, e com isso liquidou a expansão da pandemia naquele país.
A preparação para a pandemia deveria ter seguido uma lógica responsável, com proibição de aglomerações desnecessárias (festas, por exemplo), redução de aglomerações necessárias como no transporte público (aumentando a quantidade de ônibus, por exemplo), aumento extensivo de leitos de UTI, obrigação de medidas de distanciamento em ambientes com alguma aglomeração (comércios e restaurantes, por exemplo), isolamento social de pessoas do grupo de risco, entre outras medidas. Trancar por trancar não pode ser a solução. A Associação Brasileira de Pedagogia (ABP) recomendou o retorno às aulas, alertando para o risco de depressão e danos mentais em nossas crianças, por conta desse trancamento geral. Que tipo de adultos somos, se nem de nossas crianças estamos cuidando? Será que o alerta da ABP é algo tão surpreendente e inesperado, que não podia ter sido previsto?
As escolas no Reino Unido não fecharam durante os 9 meses de bombardeamento nazista em suas cidades, entre 1940 e 1941. O vírus é algo sério e precisamos tomar todas as medidas de segurança possíveis para evitar a contaminação. Mas o antídoto não pode ser pior que a doença. Crianças podem tomar decisões baseadas em emoção. Governantes não podem.