19 de setembro de 2024

Índio também é brasileiro!

O artigo dá voz ao sofrido povo indígena do Brasil.

Indícios de atividade humana de nossos  ancestrais no Brasil remotam 20 mil anos, talvez bem mais.

Um levantamento feito pelo IBGE em 1998 <https://bit.ly/3l32son> estimou que no século XVI, a população era de 2.431.000 índios, sendo que em 1998, era de 302.888 índios, considerando as pessoas que vivem nas Terras Indígenas, as quais ocupavam cerca de 11,6% do território nacional, segundo dados da FUNAI.

A vida da maioria dos índios no Brasil não tem sido fácil:

1o) historicamente foram dizimados pelos estrangeiros que aqui chegaram. Segundo os números acima, em 498 anos, a redução brutal da população indígena foi de 702,6%,  ora morrendo doenças vindas da Europa, ora morrendo em trabalho forçado, de escravo e sem remuneração, ora morrendo em guerras contra os invasores;

2o) historicamente seus direitos têm sido alijados pela maioria dos governantes e políticos do país, bastando lembrar que desde 1500, o Brasil já teve oito constituições e somente na Constituição de 1988 (ou seja 488 anos após chegada dos Portugueses) é que de fato os direitos dos indígenas foram inscritos pela primeira vez em uma Constituição Federal.

Neste artigo <https://bit.ly/3gcEZNv> escrito pela Dra Danielle Bastos Lopes, o leitor terá conhecimento sobre a trajetória dos grupos indígenas nas constituições de nosso país, bem como o fato de que o Estado colonial Português, imperial e republicano considerou as etnias como categorias transitórias ou em extinção e que somente na Constituição de 1988 é que os índios passam a ter direitos sobre a terra, a língua, a educação e a cultura. Para se ter ideia, no período colonial, a Coroa Portuguesa  diferenciava os índios em duas formas: os amigos/aliados ou os bravos, os primeiros atendiam aos interesses da Coroa e eram usados como escravos nas colônias, enquanto os segundos eram os resistentes à catequese da Igreja Católica e à “civilização”. Para os índios “amigos” a política era de “descimento” com processo de persuasão dos índios, sem uso da violência, para os bravos a política era outra, que tal pesquisar mais sobre o assunto?

Para lascar, o comando da FUNAI é fortemente loteado por puxa sacos dos políticos, se quer é presidida por indígenas, essa instituição deveria ter sido pensada pelos, com e para essa comunidade. Que tal o leitor fazer um levantamento rápido, para identificar, entre 1985 e 2020, o número de presidentes de origem indígena? O último nomeado para comandar a FUNAI não tem nada a ver com causa indígena, é uma vergonha, fazendo nomeações de gente despreparada, com MPF recomendando anulação, sem contar que ele tem sido leniente para enfrentar os interesses de ruralistas, garimpeiros, madeireiros e caçadores (maioria eleitor e apoiador de Jair Bolsonaro), gerando alto descontentamento de servidores concursados e indigenistas na FUNAI.

3o) massacres ou assasinatos dos índios por brasileiros

Há vários registros nos últimos 60 anos, envolvendo latifundiários, madeireiros, mineradores, grileiros invasores ilegais de terras que tentam se apropriar das riquezas das terras indígenas, incentivados até por membros das Forças Armadas durante o triste período da ditarura militar. Para exemplificar, índios Waimiri Atroari foram massacrados um pouco antes e durante o Plano de Integração Nacional, decretado pelo general Médici, que previa ocupar 2 milhões de Km2 na Amazônia, por acreditar que havia “vazios terrioriais e demográficos”, desconsiderando totalmente a existência de populações indígenas que viviam nas regiões destinadas para ocorrer obras como a rodovia Transamazônia. O genocídio dos Atroaris pela didatura militar ocorreu a partir de 1974, com fatos fartamente documentados e que foram narrados por sobrevimentes ao MPF. Neste artigo <https://bit.ly/2DBYphC> o leitor tem acesso aos depoimentos de índios sobreviventes, de alguns que  trabalharam em obras, como a da abertura da BR-174, e que presenciaram a truculência do Batalhão de Infantaria de Selva (BIS) <https://bit.ly/2DBYphC>;

4o) historicamente há alta impunidade

Continuemos o caso dos Waimiri Atroari, pois o MPF-AM instaurou um inquérito civil público em 2012, os procuradores durante 5 anos coletaram documentos e realizaram oitivas com as testemunhas do genocídio contra os Waimiri Atraori. As lideranças concordaram em torná-la uma ação civil pública, movida em ag/17, para responsabilizar o Estado (União e FUNAI) e cobrar indenizações no valor de R$ 50 milhões pelos massacres que ocorreram durante a construção da BR-174. Em fev/19 (7 anos após a abertura do inquérito), pela primeira vez os indígenas puderam relatar à justiça os ataques sofridos durante a abertura  da BR-174, neste link do MPF <https://bit.ly/327shdY> o leitor tem acesso aos relatos de uso de helicópteros jogando veneno e explosivos sobre centenas de indígenas reunidos para celebração de rituais de passagem, além de tiros, degolações, tratores que passavam destruindo os roçados e locais considerados sagrados pelos índios, são relatos que deveriam envergonhar a comunidade militar brasileira, especialmente a velha geração que insiste em defender a ditadura.

Na ação, o MPF sustenta que o conjunto de provas apresentadas à Justiça “demonstra que o Estado brasileiro promoveu ações baseadas nas políticas de contato e de ataques diretos aos indígenas que causaram a redução demográfica do povo Waimiri-Atroari em larga escala”. O relatório da Comissão Nacional da Verdade aponta, com base em dados oficiais, que houve uma redução de 3000, na década de 70, para apenas 332 indígenas vivos na década de 80, período de maior atividade do empreendimento de construção da rodovia. O processo segue em tramitação na 3ª Vara Federal do Amazonas e o leitor pode acompanhar o desenrolar dos fatos pelo número 1001605-06.2017.4.01.3200.

E hoje, 2019/20, como os índios estão sendo tratados pelo governo militar que se instalou no planalto? infelizmente, são ignorados pelo Captão Jair e General Mourão!  Atualmente, os índios estão sofrendo em alta escala, ora da Covid-19, ora sendo feridos, mortos ou expulsos de suas terras por grileilos, madeireiros, latifundiários ou milicianos ilegais, os quais seguem destruindo a Amazônia e o Pantanal com destruição das florestas, incluindo áreas indígenas protegias por Lei, bastando lembrar que no governo Bolsonaro há recordes de aumento de desvatação e de queimadas na Amazônia, com funcionários competentes do INPE <exemplo Dr Ricardo Galvão, eleito cientista do ano 2019 pela famosa revista Nature → https://bit.ly/2Ee01OC> ou do IBAMA <exemplo Mestre Olivaldi Alves Borges Azevedo → https://glo.bo/2CIjZ3O>, sendo perseguidos ou sumariamente demitidos por executarem corretamente suas funções.

A situação de abandono dos índios está tão crítica que uma representação deles já apelou ao STF, Ministro Barroso já intimou a União duas vezes, pedido proteção aos indígenas contra a pandemia covid-19 <https://bit.ly/3188QT3>, sem ter ainda obtido resposta satisfatória do governo Bolsonaro.

Diante do exposto, senhores militares que vivem sentados nos confortáveis escritórios do Governo Federal, índio também é brasileiro, tem direitos inscritos na Lei 6001, de 19 de dezembro de 1973, referente ao seu Estatuto, bem como pela Carta Magna de 1988 (título VIII, “Da Ordem Social”, Capítulo VIII), então façam o mínimo, cumpram ao menos a ordem, a lei, a constituição.

Jonas Gomes

Prof. Dr. Jonas Gomes da Silva - Professor Associado do Dep. de Engenharia de Produção com Pós Doutorado iniciado no ano de 2020 em Inovação pela Escola de Negócios da Universidade de Manchester. E-mail: [email protected].

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