É impressionante observar como o diálogo faz toda a diferença na vida das pessoas, na política, no trabalho e na sociedade em geral. Não existe vida plena, justiça social, inclusão, amor, amizade sem diálogo.
Semana passada conheci dona Ana*, uma mulher preta, sexagenária, que criou e educou sozinha sete filhos e que agora, por forças das circunstâncias, assumiu a missão de educar os netos.
O caso acontecido foi esse. O aluno não queria fazer as atividades escolares. Há dias ele vinha sonolento, disperso e relapso em sala de aula. É verdade que ele não perturbava os colegas, e as aulas seguiam normalmente.
O problema foi essa mudança de comportamento brusco. Ninguém muda de uma hora para a outra, sem nenhum motivo. O que afligia aquele estudante? Mandei chamar seus responsáveis.
Foi aí que dona Ana apareceu na escola. E ela chegou logo dizendo: – “Professor Lemos, esse aí não é meu filho não, ele é meu neto. O senhor sabe como é essa geração. A mãe dele não deu a educação que recebeu de mim, agora ele está aí, fazendo o que não deve”.
Dona Ana me contou como fora a sua vida. Disse-me que ficou viúva muito jovem e que teve que trabalhar muito, trabalhou de babá e na construção civil para sustentar, vestir e educar os seus sete filhos pequenos.
Depois de enxugar algumas lágrimas que escorriam pelo rosto, ela concluiu dizendo: — “Professor Lemos, eu não vim aqui falar de mim. Eu vim aqui porque o senhor mandou chamar os responsáveis do Kelvin*.
— Cadê a mãe do Kelvin? Por que ela não veio? O Kelvin mora com a senhora? — “Uma pergunta de cada vez, professor Lemos” — pediu-me dona Ana. E ainda com os olhos cheios de lágrimas, continuou:
— A mãe do Kelvin, professor Lemos, conheceu um homem pela internet e abandonou tudo, assim, de repente, para viver essa paixão na terra natal do namorado. Até hoje não temos notícias dela. Não sabemos se ela está viva ou morta. Sei que os filhos dela, três no total, o Kelvin é o mais velho, estão sofrendo muito. A menorzinha, de 8 anos, nem come direito”.
Diante daquele relato fiquei sem palavras, sem saber o que dizer para aquela senhora. E parecendo que ela lia os meus pensamentos, antecipou-se: — “Não se preocupe professor Lemos, diga-me o que o Kelvin fez que eu vou colocar ele no eixo. Ele chamou algum palavrão para o senhor?”
— Não. Nada disso, dona Ana! O Kelvin é um excelente aluno. Ele só não está entregando as atividades. — Que malandro!!!
— Não só as minhas atividades, mas as atividades dos outros professores também! Semana passada ele até perdeu as provas.
Quando eu terminei de falar, dona Ana disse-me: — “Professor Lemos, educar é tentar melhorar, todos os dias, com gotas homeopáticas de sabedoria. Anote aí professor, o Kelvin vai melhorar na escola”.
Dito e feito. Na outra aula o Kelvin voltou a ser o aluno que era antes: dedicado, responsável e estudioso!
Se eu já sabia da importância do diálogo na educação, a partir daquele dia intensifiquei-o ainda mais com os meus alunos, embora nem sempre fácil, mas é preciso manter a esperança e, consequentemente, um pouco de paciência.
*nome fictício.