14 de outubro de 2024

Golda, a mulher de uma nação

Breno Rodrigo de Messias Leite*

O filme “Golda, a mulher de uma nação” (2023), do diretor Guy Nattiv, já estréia como um clássico do cinema. O filme narra a trajetória da primeira-ministra Golda Meir, líder do Partido Trabalhista israelense, em meio a Guerra do Yom Kippur, de 1973. (A quinta guerra de Israel desde sua fundação em 1948). Embora o filme seja sobre os eventos de uma guerra, a enredo não se limita ao conflito em si – campos de batalha, trincheiras, bombardeios aéreos, etc. O foco da trama é o processo decisório no contexto do conflito armado. 

Golda, ao receber o primeiro relatório sobre os possíveis ataques do Egito e da Síria contra Israel, resolve montar um gabinete de crise para monitorar com mais cautela os movimentos das duas nações. Com as informações em mãos, os membros do gabinete precisam elaborar um sofisticado cálculo de estratégia vis-à-vis o conflito iminente: afinal, quando se deve ir à guerra? Este talvez seja o dilema moral mais difícil diante de uma ameaça militar. O gabinete sob o seu comando era formado por representantes das forças armadas, pelo aparato de Inteligência (Mossad) e pela liderança político-diplomática. A triangulação dos comandos militar-político-diplomático constituía a alma da coordenação decisória na Guerra do Yom Kippur.

O ataque das forças militares árabes começou no dia 6 de outubro de 1973. O Egito e a Síria cruzaram as linhas do cessar-fogo da Guerra dos Seis Dias, em 1967, e avançaram em direção ao Sinai pelo Canal de Suez e das Colinas de Golã, respectivamente. Uma ofensiva em duas frentes, um pesadelo para a logística militar de qualquer nação agredida, possibilitou um rápido avanço dos dois exércitos árabes no interior do território israelense.

A ação coordenada do gabinete de crise liderado pela líder trabalhista foi imediata. O filme explora as incertezas em torno do processo decisório. Afinal de contas, decidir diante de tantas incertezas é, sobretudo, confiar na percepção, no instituto e na intuição. A contra-ofensiva das forças de defesa de Israel foi uma tragédia, com a perda de milhares de vidas de soldados e equipamentos militares. Então, Golda decide solicitar equipamentos bélicos dos Estados Unidos para equiparar a assistência militar russa aos dois exércitos árabes. O fornecimento de material bélico norte-americano foi decisivo nos esforços da contra-ofensiva.

Outro ponto de destaque no filme é o estado de nervos. A iminência da guerra e a guerra em si consomem a saúde mental dos tomadores de decisão. (Golda entrava em tratamento médico na luta contra um câncer). A tensão psicológica dos atores estratégicos é muito bem enfatizada na obra. A tensão psicológica de todos os israelenses se deve ao fato de toda guerra de Israel ser uma guerra existencial, ou seja, uma guerra pela sobrevivem da nação judaica.

Após vinte dias de ofensiva árabe e contra-ofensiva israelense vem a vitória e o cessar-fogo. Golda Meir e Anwar Sadat iniciam um diálogo para por fim às hostilidades e para o restabelecimento das relações diplomáticas. Em 1978, ano do falecimento de Golda, primeiro-ministro Menachem Begin e o próprio presidente Sadat firmam os Acordos de Paz de Camp David.

É inevitável na relacionar o enredo do filme com os eventos recentes: a invasão do Hamas no dia 7 de outubro de 2023, cinquenta anos depois da Guerra do Yom Kippur, e o início do conflito entre Israel e Hamas. O filme ajuda-nos a entender bem o processo de decisão em cenários de conflito e um pouco da dinâmica psicológica dos tomadores de decisão.

*é cientista político     

Breno Rodrigo

É cientista político e professor de política internacional do diplô MANAUS. E-mail: [email protected]

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