19 de setembro de 2024

Estudantes de hoje: futuros cidadãos com educação incompleta, mas de sapatos

Entre os candidatos universitários que entrevistei em processo de seleção para ocupar um posto de trabalho burocrático, menos da metade soube responder certo qual o valor a pagar por um sapato caso o vendedor oferecesse 10% de desconto para pagamento em dinheiro sobre um preço da etiqueta de R$ 90,00.
O ensino fundamental dos candidatos que responderam corretamente que o valor a pagar em dinheiro é de R$ 81,00 foi concluído, na maioria, no setor privado.

As respostas mais comuns dos candidatos reprovados foram: 1ª. “Posso usar uma calculadora?”; 2ª. “Ficaria por R$ 80,00?”; e 3ª. “Não sei responder”. A maioria destes candidatos reprovados concluiu o ensino fundamental do setor público.

Uma das causas prováveis para este rendimento escolar mais baixo do setor público, é que nas escolas públicas a orientação é de que os alunos não podem ser reprovados.
Para não serem reprovados, lhes é atribuída uma nota mínima que permite a aprovação, quer tenham aprendido o conteúdo ou não. Uma parte sai de fato com conteúdo aprendido, e os demais saem com um patamar sofrível.

Na escola privada, aprovar alunos que façam jus, informa ao mercado que a escola é boa e passa a ser um atrativo comercial. Algumas escolas até anunciam publicamente as boas colocações de seus melhores alunos em propagandas que fortalecem a sua marca e ajudam a receber novas matrículas. Ao reprovar um aluno, evitam que este lhes faça propaganda negativa em fases seguintes da vida, e ainda garantem matrículas e mensalidades em suas salas de aula para onde os repetentes terão que retornar.

No setor público a lógica é outra: um repetente ocupará o lugar de um novo aluno que poderá perder o ano letivo por falta de vagas causando problemas sociais e políticos. Faltariam escolas e o custo destes alunos seria o dobro, sendo perdido o gasto anual com o uniforme, com a merenda escolar, com os livros e com os salários dos profissionais da educação. Por isso não se reprova, principalmente.
Ocorre que dar a nota mínima aos alunos com educação insuficiente, e são milhares deles, vai formar cidadãos despreparados e que causarão um retrocesso econômico e social em futuro próximo quando se inserirem como força de trabalho. Isto explica em parte porque atualmente 30 alunos iniciam um curso acadêmico e só o terminam 7 ou 8.

Outra das causas deste quadro, é que muitas das escolas públicas têm matriculadas crianças e jovens alunos que em parte são assistidos pelos seus avós por falta de assistência paterna ou materna, e a maioria destes avós não pode mais acompanhar o desempenho escolar de seus netos no ritmo e com a profundidade que seria ideal.
Há ainda a realidade mais recente de alunos que se apresentam sonolentos ou até dormem durante a aula porque invadem as madrugadas na internet sem o controle de seus responsáveis. Como poderão absorver conteúdo na escola? O que estes pais esperam de seus filhos?

O que também contribui para o desalentador futuro previsto, é que os alunos mais crescidos sabem que a escola não pode reprovar, e esta descoberta torna parte deles ainda mais desinteressada do aprendizado, por mais que se esforcem muitos dos abnegados professores.
O adolescente, que normalmente já um pouco “malandro”, coisa da idade, conta com esta aprovação automática na escola sem qualquer compromisso seu. Aprender a tabuada do 7 é só para quem não é esperto ou ainda é inocente.
Na questão da saúde, alguns pais permitem que as crianças se alimentem de refrigerantes e pacotes de biscoitos e salgados ao invés de se nutrirem da merenda escolar; esta formação alimentar inapropriada, quando adultos, lhes ensejará problemas de saúde e baixa colaboração social produtiva; mais custo para o estado.

Contribuindo com este cenário sombrio, há ainda um fator financeiro pessoal: parte dos professores menos abnegados e parte dos dirigentes, estão interessados e atentos ao 14.o salário e até o 15º. salário, que é pago somente se a escola apresentar reprovação zero, mesmo que artificialmente. Parece um absurdo, mas são fatos.
Caso haja alguma escola que não adote esta prática, precisaria ser identificada e divulgada, e seus dirigentes mereceriam ser premiados.

Madrugadas de internet, salgados na merenda, material escolar garantido e de graça, aprovação garantida sucessiva e ininterrupta, descompromisso com o aprendizado e distância de pais muito ocupados ou pouco preocupados, certamente não ajudarão ao jovem saber o preço de um sapato com desconto de 10%, mas continuarão calçados.

Pais e dirigentes poderiam se lembrar que sempre é tempo de se corrigir o rumo.

Amazonólogo, MSc em Sociedade e Cultura da Amazônia – UFAM, Economista, Professor de Pós-Graduação e Consultor de empresas especializado em ZFM.

Juarez Baldoino da Costa

Amazonólogo, MSc em Sociedade e Cultura da Amazônia – UFAM, Economista, Professor de Pós- Graduação e Consultor de empresas especializado em ZFM.

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