Entre os candidatos universitários que entrevistei em processo de seleção para ocupar um posto de trabalho burocrático, menos da metade soube responder certo qual o valor a pagar por um sapato caso o vendedor oferecesse 10% de desconto para pagamento em dinheiro sobre um preço da etiqueta de R$ 90,00.
O ensino fundamental dos candidatos que responderam corretamente que o valor a pagar em dinheiro é de R$ 81,00 foi concluído, na maioria, no setor privado.
As respostas mais comuns dos candidatos reprovados foram: 1ª. “Posso usar uma calculadora?”; 2ª. “Ficaria por R$ 80,00?”; e 3ª. “Não sei responder”. A maioria destes candidatos reprovados concluiu o ensino fundamental do setor público.
Uma das causas prováveis para este rendimento escolar mais baixo do setor público, é que nas escolas públicas a orientação é de que os alunos não podem ser reprovados.
Para não serem reprovados, lhes é atribuída uma nota mínima que permite a aprovação, quer tenham aprendido o conteúdo ou não. Uma parte sai de fato com conteúdo aprendido, e os demais saem com um patamar sofrível.
Na escola privada, aprovar alunos que façam jus, informa ao mercado que a escola é boa e passa a ser um atrativo comercial. Algumas escolas até anunciam publicamente as boas colocações de seus melhores alunos em propagandas que fortalecem a sua marca e ajudam a receber novas matrículas. Ao reprovar um aluno, evitam que este lhes faça propaganda negativa em fases seguintes da vida, e ainda garantem matrículas e mensalidades em suas salas de aula para onde os repetentes terão que retornar.
No setor público a lógica é outra: um repetente ocupará o lugar de um novo aluno que poderá perder o ano letivo por falta de vagas causando problemas sociais e políticos. Faltariam escolas e o custo destes alunos seria o dobro, sendo perdido o gasto anual com o uniforme, com a merenda escolar, com os livros e com os salários dos profissionais da educação. Por isso não se reprova, principalmente.
Ocorre que dar a nota mínima aos alunos com educação insuficiente, e são milhares deles, vai formar cidadãos despreparados e que causarão um retrocesso econômico e social em futuro próximo quando se inserirem como força de trabalho. Isto explica em parte porque atualmente 30 alunos iniciam um curso acadêmico e só o terminam 7 ou 8.
Outra das causas deste quadro, é que muitas das escolas públicas têm matriculadas crianças e jovens alunos que em parte são assistidos pelos seus avós por falta de assistência paterna ou materna, e a maioria destes avós não pode mais acompanhar o desempenho escolar de seus netos no ritmo e com a profundidade que seria ideal.
Há ainda a realidade mais recente de alunos que se apresentam sonolentos ou até dormem durante a aula porque invadem as madrugadas na internet sem o controle de seus responsáveis. Como poderão absorver conteúdo na escola? O que estes pais esperam de seus filhos?
O que também contribui para o desalentador futuro previsto, é que os alunos mais crescidos sabem que a escola não pode reprovar, e esta descoberta torna parte deles ainda mais desinteressada do aprendizado, por mais que se esforcem muitos dos abnegados professores.
O adolescente, que normalmente já um pouco “malandro”, coisa da idade, conta com esta aprovação automática na escola sem qualquer compromisso seu. Aprender a tabuada do 7 é só para quem não é esperto ou ainda é inocente.
Na questão da saúde, alguns pais permitem que as crianças se alimentem de refrigerantes e pacotes de biscoitos e salgados ao invés de se nutrirem da merenda escolar; esta formação alimentar inapropriada, quando adultos, lhes ensejará problemas de saúde e baixa colaboração social produtiva; mais custo para o estado.
Contribuindo com este cenário sombrio, há ainda um fator financeiro pessoal: parte dos professores menos abnegados e parte dos dirigentes, estão interessados e atentos ao 14.o salário e até o 15º. salário, que é pago somente se a escola apresentar reprovação zero, mesmo que artificialmente. Parece um absurdo, mas são fatos.
Caso haja alguma escola que não adote esta prática, precisaria ser identificada e divulgada, e seus dirigentes mereceriam ser premiados.
Madrugadas de internet, salgados na merenda, material escolar garantido e de graça, aprovação garantida sucessiva e ininterrupta, descompromisso com o aprendizado e distância de pais muito ocupados ou pouco preocupados, certamente não ajudarão ao jovem saber o preço de um sapato com desconto de 10%, mas continuarão calçados.
Pais e dirigentes poderiam se lembrar que sempre é tempo de se corrigir o rumo.
Amazonólogo, MSc em Sociedade e Cultura da Amazônia – UFAM, Economista, Professor de Pós-Graduação e Consultor de empresas especializado em ZFM.