14 de outubro de 2024

Férias – Parte Final

Chegamos à parte final dessa série afirmando que um(a) professor(a) de férias deve se comportar como qualquer cidadão desse país, sempre respondendo por seus atos. Alguns aproveitam para viajar, outros para colocar em prática aquilo que os afazeres diários não permitem durante o ano letivo, principalmente para ler.

Conheço vários professores que preferem “viajar na leitura” do quer sair por aí, “sem lenço e sem documento”. É o caso do professor Luís Silva* (Nome fictício, pessoa real). Para ele, tirar férias é viajar nos livros. 

“Todo ano eu viajo, mas esse não foi possível por causa dessa pandemia. Sendo assim, vou aproveitar para colocar em dia as minhas leituras. Você sabe que professor nenhum consegue durante o ano letivo ler muita coisa. Não sobra tempo, não adianta!

O que o professor faz durante o ano letivo é elaborar planos de aula, provas, exercícios; corrigir provas, elaborar exercícios, participar de reunião pedagógica, etc., numa rotina louca que não sobra tempo para ler um bom livro ou assistir uma série, um filme, um documentário, por mera e feliz distração intelectual, você não concorda comigo?

Durante o ano letivo, tudo o que o professor consegue ler são livros técnicos, paradidáticos, artigos científicos, tudo para “ajudar” no seu trabalho pedagógico. Agora, aquela leitura pela leitura, pelo prazer de ler um romance, um conto, uma poesia, ah, isso mesmo só nas férias!

Este ano eu ia viajar para Fortaleza, as passagens já estavam compradas. Ia visitar uns parentes da minha esposa. Faz três anos que não vamos lá. Mas por causa dessa pandemia nós decidimos, de comum acordo, que a nossa viagem esse ano seria na leitura. É assim que está sendo as minhas férias, nos livros, e eu posso te garantir que está sendo maravilhosa. 

Uma tragédia que estamos vivendo no mundo, no país e especialmente aqui em Manaus, não é meu amigo? Isso tudo por causa da ganância desses políticos inescrupulosos, da corrupção e desse maldito vírus, ou seria os três juntos e misturados?

Para ser sincero contigo, eu não gosto muito de viajar. Tenho medo de avião, também não sei nadar. Como só podemos sair de Manaus pelo ar ou pelos rios, eu prefiro ficar em casa, com a minha família, do quer viajar. Além do mais, eu faço parte do grupo de risco. Tenho mais é que me cuidar e proteger àqueles que eu amo.

Meu amigo, como professor, eu sempre me fiz as seguintes perguntas: De que vale o conhecimento para que eu a conserve dentro de mim? De que serviria a educação se não fosse para ser compartilhada? Gosto e tenho muito orgulho de ser professor!

 Para mim, a essência da educação é o compartilhamento do conhecimento, do ensino, da vida. Educação, vida e ação sempre andam juntas! Por isso, eu quero aqui te parabenizar por esse seu trabalho. Você é um exemplo para mim, e para muitos professores desse Estado. Ah, como eu gostaria que os verdadeiros professores dessa cidade fossem valorizados!

Infelizmente a sociedade atual não valoriza quem é ético, honesto, trabalhador. Muitos preferem os bajuladores, pessoas sem escrúpulos, que fazem de tudo, de tudo mesmo para serem vistos, aplaudidos, mas essas pessoas são como “sepulcros caiados”, como disse Jesus, “bonitas por fora e feias por dentro”.

Meu amigo, eu gosto é de pessoas assim como você, que vencem na vida por vontade, esforço e méritos próprios. Por isso resolvi responder essa sua entrevista. Eu acredito em pessoas éticas, justas, honestas, trabalhadoras, respeitosas, bondosas. Pessoas que pensam mais nos outros do que em si mesmos!

Mais você me pediu para eu lhe falar do que eu mais gosto de fazer nas minhas férias. Olha, acredito que já deu para perceber que o que eu mais gosto de fazer nas minhas férias é ler. Leio de tudo, principalmente livros de História, Filosofia e Ciências Naturais. 

Gosto muito, também, de biografias. Por falar em biografias, comecei ontem a ler a biografia de Dom Pedro II: “A história não contada – O último Imperador do Novo Mundo”. Recomendo leitura. Muito interessante. Estou amando e aprendendo muito.

Quanto a filosofia, gosto muito do filósofo alemão Emanuel Kant. O seu imperativo categórico é um desafio para todos nós, professores ou não, da sociedade atual. E o que dizer da filosofia utilitarista do filósofo inglês Jeremy Bentham? Para este, só “merece crédito” o ser humano que deixar-se guiar por sentimentos, emoções ou motivos utilitários. Pode isso? Ou melhor, para que tudo isso? Eu não acredito no utilitarismo. 

De forma geral, meu amigo, em minhas leituras fiz uma descoberta maravilhosa: o amor não se encontra em qualquer esquina ou em prateleira de supermercado. Também não se procura, ele aparece sozinho, pois o meu apareceu quando menos esperava. Ele apareceu num tempo em que parecia que a vida não tinha mais sentido. Foi quando ganhei um livro de presente. O livro se chamava “Fernão Campelo Gaivota”, você deve conhecer!

Este livro mudou completamente a minha vida e foi o começo de minha história como leitor. Não tenho vergonha de dizer, este foi o primeiro livro que li até o final. Quando terminei de ler esse livro tive a impressão de que a minha vida estava marcada, de uma forma ou de outra, com o mundo da poesia, da escrita, da educação, da literatura….

Enfim meu amigo, acho que fiz uma digressão longa demais e talvez tenha me desviado da sua pergunta inicial. Mas eu posso te garantir uma coisa: as minhas melhores férias foram sempre nos livros. A leitura é uma faísca que incendeia o coração de quem quer ir além das aparências. Isso é o que eu faço nas minhas férias: ler, escrever e escultar o meu coração. Isso sou eu. Isso é um pouco de mim.”

Luís Lemos

É filósofo, professor universitário e escritor, autor, entre outras obras, de "Filhos da Quarentena: A esperança de viver novamente", Editora Viseu, 2021.

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