Sabe-se, ou se deveria mesmo saber, que desde o tempo do onça os fatos são os fatos, não importa que se diga o contrário deles, mesmo pulando o muro das convenções. É o que se diz e o que dizem de si mesmos os fatos. Não é? Olha só o caso da Aihtnyc: ela era quando o foi; foi até deixar de ser como era. Morreu e foi, quando já não era, mas nunca para o nunca mais, porque assim virou saudade; saudade alegre, se isso pode haver. Pode, sim, já que se está falando dela! É ou não é? Tá confuso? Tá, mas, ora bolas, ela pregava peças assim, a torto e a direito. Veja-se aqui o nome induzido às avessas. Pensa que não se manja? É, sim, ela fica sacaneando lá do outro lado, sabendo que o redator está mesmo envelhecendo, que nem foi ao velório. Quedou-se em casa, chorando, nas mãos a foto da garota, relembrando o rosto de menina. Resolveu guardar-se para ir só no próprio enterro, e olhe, lá! E quanto à memória dele? Memória… memória… memória… o que se ia dizer mesmo …? Esqueci, droga!
Como ela era dos veras, quando o foi dos veras? Seguinte, nome de uma deusa da Mitologia, Diana ou Artemis, natural de Cinto, monte grego sagrado, da ilha de Delos, reverências da Antiguidade. É de saber, o nome de batismo desenha as pessoas? O padre ao batizar criticou nome dado a ela, que seria pagão. Mas ela tornou-se especial, diferente, sacudida, às vezes irreverente, sacana, viva. Parece, porque o seu nome não era como como os das vizinhas: Amélia, Augustinha, Caetana, Celina, Clarice, Conceição, Estrela, Gertrudes, Guiomar, Hermosina, Kamélia, Dos Anjos, Mª Luiza, Mônica, Nair, Olívia. Fique-se por aqui e pasme-se!
Daí, quando o foi, então menina bonitinha, com sede de saber, desde logo denotando um agudo espírito crítico, dotada de atitudes quetais, sincera, dizendo o que pensava, ainda que o gesto molestasse alguém. Por vezes sem conta admoestou raivosamente a própria mãe, que, belicosa, ciumenta, enfezava ao extremo o sofrido marido. Aihtnyc solidarizava-se ao pai, que ela tanto amava, e era amada, sofrendo muito quando este afinal divorciado saiu de casa, mas, depois, dado o silêncio no lar, afastado o vale de lágrimas, acabou saboreando o gesto, mas diante de uma indagação: com quem você está, quando está sozinho? Olha só!
Deu-se que ficou mais diligente, e até bem mais sociável, revelando-se romântica e afetuosa com todos mas em especial com uma tia, um irmão caçula e, sim, com o pai. Bem mais vivida, desenvolveu personalidade independente, cultivando generosidade, solidariedade, altruísmo, tenacidade, originalidade e criatividade, posturas marcantes, além de se revelar como muito trabalhadora, corajosa, líder entusiasmada em buscar do poder desafiando convenções “uma chatice” que não lhe interessava. Como os irmãos – degredados filhos de Eva – tragados pelo ambiente familiar danoso que os experts fixam como “o lar é o lugar de construir ou destruir pessoas.” Mais adiante, mãe zelosa, já que tivera exemplo materno em contrário, agiu com posturas surpreendentes, bem longe daquele perfil temível, confirmando-se tudo o que aqui consta neste texto. Galgou os andaimes do mundo, como amiga e conselheira, cujos 3 filhos alcançaram sucesso profissional, tendo um deles tornado-se médico, que ora é bem referido.
Chega-se ao desfecho, sendo hora de revelar que Aihtnyc é na verdade Cynthia, cabendo-lhe os votos de “Réquiem Aeternam”, mais estes belos versos finais:
Cultivo uma rosa brava no fundo do coração. É uma rosa de soberba. Não é de modéstia não. Cultivo uma rosa brava no fundo do coração. Não é rosa de esperança. Não é rosa verde não. Cultivo uma rosa brava no fundo do coração. É vermelha como as uvas das varas desse brasão. Cultivo uma rosa de arrogância. Não é de humildade não. Cultivo uma rosa brava no fundo do coração. * (Qu4rTeto, de Luiz Bacellar).